ARTICULISTAS

A propaganda, as crianças e a responsabilidade civil

Mônica Cecílio Rodrigues
Publicado em 17/03/2019 às 18:36Atualizado em 17/12/2022 às 19:06
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Um tema que é caro e certamente será o futuro do direito - a responsabilidade civil. Ainda um pouco tímido em nossos julgados quando diz respeito a alguns sujeitos, outras vezes com relação ao direito material. Mas caminhando lentamente vai tomando corpo nas ações propostas para que o poder judiciário solucione.

A função da responsabilidade civil não é só impor a pena pecuniária para aqueles que já desrespeitaram os direitos, quer sejam eles direitos individuais ou direitos coletivos. Mas também, traz ínsita em sua natureza, a função pedagógica do instituto, quando previne outros ilícitos civis.

Alguns direitos após serem desrespeitados não terão punição econômica capaz de servir para repará-los, daí a importante função pedagógica do instituto, educando aos que faltam ao respeito, para não mais incidirem no mesmo erro e para aqueles que pretendam fazê-lo que pense duas vezes.

Já comentamos aqui sobre a responsabilidade civil aplicada aos direitos coletivos, amparados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (JM on line de 29/10/2018); e agora mais uma vez devemos aplaudir a solução majestosa da Corte Superior, justapondo a legislação consumerista, que ao decidir sobre a responsabilidade, em uma ação civil pública, condena a empresa por publicidade duplamente abusiva. Em um primeiro momento em razão do público atingido - crianças -, e em um segundo em razão da chamada venda casada para este mesmo público, manipulando a deficiência de julgamento e inexperiência da criança.

Em total afronta a lei que protege o consumidor, a empresa condenada, utiliza os recursos de marketing para a publicidade e venda de alimentos, para o público infantil. Apesar da liberdade concedida aos menores sobre a decisão do que consumir, ainda reside como dever dos pais ou responsáveis em orientá-los a respeito dos alimentos, primando pela saúde.

Razão pela qual é considerada abusiva e não pode permitir que o marketing, como estratégia de convencimento, atinja o consumidor, exorbite e manuseie o seu conhecimento ainda pueril.

Indiscutível que o desconhecimento da criança foi utilizado como manobra para atingir o consumo que se quer impor; e, não tendo condições de optar pela melhor compra, acaba adquirindo produtos nocivos a sua saúde com vistas a receber o falso “brinde” que acompanha a compra.

Um verdadeiro embuste para vender aquilo que não presta ao consumo infantil, mas que ofertado juntamente com o objeto de desejo torna-se atraente para atingi-lo.

Não há como negar os abusos perpetrado pela empresa.

A legislação brasileira não permite que o fornecedor condicione a venda de um produto somente pela aquisição de um segundo, pois se acontecer caracteriza venda casada.

Acrescida a venda casada, os consumidores atingidos são infantes, pois lhes faltam o total discernimento para a liberalidade do consumo, razão pela qual a venda foi considerada duplamente abusiva.

Aqui a proteção legal é para o menor, que não pode ser desrespeitado em seu universo, ainda infantil.

E não poderia ser diferente, apenas devemos atentar para a necessidade de aplicar-se uma pena pecuniária a empresa que afrontou a legislação consumerista, sob pena de ficar capenga o julgamento e acabar por permitir a reincidência deste comportamento, uma vez que não se vislumbra no resultado do julgado a punição econômica. Ou seja, ainda é lucrativa atitude para a empresa.

A responsabilidade civil não deve só julgar para classificar como abusiva a prática, mas ato continuo deve punir, economicamente, a empresa que a desrespeite, sob pena de utilizarmos o processo sem um objetivo precípuo. Quando aplicada uma pena pecuniária de valor significativo e não só correspondente ao dano acontecido, fará com que não sejam novamente cometidos e consequentemente reprimirá a reincidência de atos abusivos.

Mônica Cecílio Rodrigues é advogada, doutora em processo civil e professora universitária. E-mail: [email protected]

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