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Os reflexos jurídicos da inseminação artificial “doméstica”

Mônica Cecílio Rodrigues
Publicado em 24/09/2018 às 08:07Atualizado em 17/12/2022 às 13:49
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São muitas as inovações que se fazem presente no Direito de Família e também no Direito Sucessório. E tais novidades de ordem fática acabam exigindo um posicionamento do legislador, quando não exigem do Poder Judiciário, solução para as questões que se tornam conflituosas e são apresentadas pelas partes.

Pois bem, aos que acompanham estas modificações puderam ler as notícias em jornais diários sobre a nova forma de inseminação artificial, denominada de “doméstica”; uma vez que não é feita em clínica especializada, com todos os requisitos médicos para o procedimento. Mas sim, feito do modo caseiro, onde o sêmen é colhido e a fecundação feita artificialmente, com seringas transportadoras deste material, sem qualquer acompanhamento médico ou assepsia exigida pela literatura médica, quando do manuseio e transporte do material genético masculino até o útero.

Ainda, como relatam as notícias o doador “quase anônimo” não será identificado e nem possuirá qualquer responsabilidade sobre esta concepção, fazendo para isto um termo que o exime de qualquer obrigação paterna futura. Em um verdadeiro contrato de exclusão da paternidade.

Apesar do objetivo deste ligeiro encontro ser a concepção intencional e muito consciente de uma vida, a maior preocupação que se deve ter são os reflexos jurídicos e bem como as consequências genéticas desta procriação não cadastrada; haja vista que, quanto a primeira não existe possibilidade legal para eximir a responsabilidade paterna, uma vez que hoje o resultado da filiação é obtida seguramente pela prova científica do exame de DNA; e quanto a segunda, em razão da falta de cadastro, relembrando o relato noticiado na reportagem, existe doador que já doou mais de noventa vezes o seu material genético, o que pode haver encontros consanguíneos em encontros futuros, comprometendo a saúde de seres humanos.

Pois bem, estes acontecimentos ainda não previstos na legislação brasileira, mas já estão acontecendo entre os desejantes da maternidade.

A justificativa dada pelos envolvidos para optarem por tal procedimento (inseminação artificial caseira) é em razão de serem hipossuficientes; e, portanto, não têm condições econômicas de arcar com o custo elevado da inseminação artificial assistida.

Não resta dúvida que quanto ao registro da maternidade do futuro rebento a legislação brasileira assegura; e no tocante a filiação paterna, apesar da tratativa das partes, está poderá ser requerida a qualquer tempo.

A inseminação artificial, quer seja a homóloga ou a heteróloga tem previsão, para o seu reconhecimento biológico ou socioafetivo. A preocupação aqui guarda lugar quanto ao posicionamento de haver uma atitude prévia de eximir o doador masculino de sua responsabilidade e também de futuros confrontos genéticos entre os nascidos.

Infelizmente, o direito ainda não possui condições de proibir estas concepções feitas sem o mínimo de cuidado frente as exigências legais que a literatura médica exige e recomenda, no caso de concepções artificiais.

Por isto, cabe aqueles que desejam a filiação o bom senso de optar por métodos que garantam a saúde da concepção e a segurança genética de que não haja laços parentais quando da cruza; pois sem tal cuidado o risco existe, e não é pouco, de comprometer a saúde daquele que virá ao mundo.

E mesmo com o registro da filiação, é assegurado e resguardado ao concebido, através do direito a personalidade, a busca no futuro de sua ancestralidade, quer seja com vistas apenas para conhecimento ou para exercer direitos de assistência ou sucessórios.

Assim, o legislador não pode fazer vistas grossas para as questões que possam surgir após a inseminação artificial caseira, sob pena de não proteger aquele que veio ao mundo sem nada escolher e o que é pior já sabendo que nada poderá fazer para se acautelar.

O Estado deve ser responsável a proporcionar e facilitar o método de inseminação artificial ao cidadão que assim deseja, com todo o acompanhamento médico necessário, sem qualquer ônus econômico.

Dra. Mônica Cecílio Rodrigues é advogada, doutora em processo civil e professora universitária.

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