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A raiz de um compromisso

Neste mês de maio de 2018, completam 20 anos que a Carta Rogatória 8356 aportou

Wagner Dias Ferreira
Publicado em 04/05/2018 às 20:57Atualizado em 16/12/2022 às 04:02
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Neste mês de maio de 2018, completam 20 anos que a Carta Rogatória 8356 aportou no Supremo Tribunal Federal solicitando a coleta de três depoimentos, no caso o de Alencar da Silveira Junior, que presidia a Comissão da Câmara na época das denúncias; de Genilson Ribeiro Zeferino, que era assessor especial da Comissão, e o meu, estagiário da CPDH-ABH, para serem ouvidos como testemunhas em um caso de violação dos direitos humanos praticada contra cidadãos da Argentina em Belo Horizonte.

Lembro-me perfeitamente de quando ainda era estudante e atuava como estagiário na Comissão Pastoral de Direitos Humanos da Arquidiocese de Belo Horizonte e a comissão foi procurada por um representante da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal de Belo Horizonte para, em parceria, conduzir o acompanhamento do caso de um cidadão Argentino, que, após ser torturado na antiga delegacia de furtos e roubos, havia perdido um pulmão e estava sendo extorquido por policiais, após a sua liberação do cárcere.

Outro cidadão argentino, que era dono de hotel no bairro da Lagoinha, em solidariedade ao amigo, pediu providências aos Direitos Humanos.

Preocupados com a integridade física do cidadão argentino, que já havia perdido um pulmão, eu e o representante da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal de BH promovemos o contato com o Cônsul da Argentina no Brasil, no saguão do Othon Palace, limitando-se ao representante consular a entrega de pequena quantia em dinheiro ao seu concidadão para que este se deslocasse até São Paulo, a fim de que ali, no Consulado, outras providências para sua volta à Argentina fossem providenciadas.

Preocupado com que o cidadão da Argentina viajasse sem documentos, foi providenciado junto à Polícia Federal do Brasil um documento de deportação a ser apresentado no embarque da rodoviária de BH, sendo acompanhado e observado pelos agentes de Direitos Humanos até o embarque no ônibus.

Após a ida deste homem para a Argentina, o hotel na Lagoinha foi desapropriado para a construção da praça do Peixe e dos viadutos que hoje povoam aquela área da cidade.

Sem o seu negócio, o empreendedor argentino decidiu voltar para sua terra. Lá chegando, extravasou sua indignação, denunciando a timidez das autoridades consulares argentinas atuantes no Brasil, que silenciaram diante da gravidade dos fatos que aconteciam com seus cidadãos fora do país natal.

O fato repercutiu naquele país de forma decisiva. Muitas notícias em jornais e revistas – segundo informações passadas por telefone, não havia internet e nem redes sociais na época – e a instauração de um processo que logo chegou ao Brasil, alcançando-me já formado, no meu terceiro ano de exercício da profissão, quando fui chamado para, juntamente com Alencar e Genilson, prestar depoimento na Carta Rogatória.

São vinte anos de uma experiência que marcou minha vida e meu compromisso pessoal com os Direitos Humanos para sempre. 

(*) Advogado e membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/MG

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