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Marielle, a ressurreição de um ideário

Morreu Marielle. Em tempo de Quaresma. De Oscar, com grito em defesa das mulheres vítimas de assédio. Em tempos de Golpe político no Estado brasileiro, praticado contra uma mulher presidente...

Wagner Dias Ferreira
Publicado em 02/04/2018 às 23:23Atualizado em 16/12/2022 às 05:08
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Morreu Marielle. Em tempo de Quaresma. De Oscar, com grito em defesa das mulheres vítimas de assédio. Em tempos de Golpe político no Estado brasileiro, praticado contra uma mulher presidente. E de enfrentamento do Judiciário presidido por uma mulher. Em tempos de filme com releitura da função de Maria Madalena e seu papel no cristianismo primitivo. Mas vive Marielle porque é chegado agora o tempo de ressurreição, insurreição e de transformação.

A sociedade brasileira está claramente dividida. Como estavam os judeus no tempo de Jesus. Havia aqueles que, gozando de privilégios na sociedade da época, recebiam favores do Império que dominava a terra. Estes queriam o silêncio, desejavam sufocar qualquer ato ou manifestação que lhes colocasse em risco os privilégios. Fariseus, Saduceus, Escribas e participantes do Templo de Jerusalém.

Há uma ascensão do discurso obstrutor. Pessoas reagindo e sendo contra os “rolezinhos”, incomodados com pobres e negros viajando de avião, reclamando de cotas nas universidades públicas (porque não aceitam compensar os 500 anos de escravidão e racismo contra toda uma etnia no país). Pessoas se levantando contra os Direitos Humanos, a favor da pena de morte, querendo a prisão perpétua. Posturas de ódio e negadoras do diálogo. Mas com mais força se manifesta a voz daqueles que querem, onde o querer é uma exigência, a transformação.

Certa vez ouvi um padre falar, em tom de provocação, que Jesus se revelou primeiro a uma mulher porque as mulheres são faladeiras e logo divulgariam a notícia. Ainda naqueles dias, e já se vão mais de 30 anos, era muito presente, como sempre foi em mim, o conflito e a dificuldade para reconhecer a importância das mulheres. Nossa cultura é machista e sexista. Nascer e crescer nesta cultura e ao longo da vida adotar uma postura, atitude, superadora desta condição exige autoexame diário e renovação constante da atitude de respeito e promoção humana.

Mas aprender ajuda. Aprendi que a mulher foi feita da costela de Adão, para ficar claro que ela não está acima e nem abaixo do homem, mas lado a lado, no mesmo nível, com a mesma importância, com os mesmos direitos e deveres, isso dito e registrado lá nos tempos patriarcais. Aprendi que foram as mulheres que garantiram o Jesus físico contribuindo para sua subsistência (Lc 8, 3) e aprendi que somente uma mulher tinha a dignidade suficiente para receber a notícia e não iria se calar diante de tão enorme acontecimento como a ressurreição de Jesus.

De uma lição aprendida: “o mérito de Kant, como já havia salientado Hegel, foi ter introduzido, do ponto de vista da fundamentação teórica, em definitivo, a ideia de liberdade no conceito de justiça, que nunca mais poderá ser dela separada, por já constituir um valor da nossa cultura” - Autor: Joaquim Carlos Salgado - Ed. Proed. 1986).

A Páscoa chegou. A liberdade chegou. A igualdade chegou.

E penso poder dizer que, em Jesus, Marielle ressuscitou! E por iss Marielle, presente!

(*) Wagner Dias Ferreira

Advogado e Membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/MG

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