ARTICULISTAS

Bênção Pai, Bênção Mãe

Há um conto que diz sobre dois irmãos tão semelhantes em suas personalidades

Ricardo Cavalcante Motta
Publicado em 26/10/2018 às 19:39Atualizado em 17/12/2022 às 14:50
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Há um conto que diz sobre dois irmãos tão semelhantes em suas personalidades que eram capazes de vender a própria mãe. Havia uma diferença, um deles não entregava. Por isso não se sabia definir a maior sordidez. Quanto à venda da mãe, empatavam, mas o que não entregava não cumpria sequer o contrato, porém sob pretexto de preservar a mãe. E que mãe seria essa que cultivou tais seres tão abjetos? Hoje as coisas andam mesmo perigosas. Pais tão distantes dos filhos, delegando a criação a terceiros descomprometidos. Cedem a recursos eletrônicos com conteúdos questionáveis. Exemplos de ganância e de rivalidade sobram. Mantêm uma relação protocolar de encontro superficial, numa indiferença sentimental que gera materialmente uma necessidade de suprir a ausência afetiva vigorosa. Atos de publicidade de fatos familiares fugazes são o que mais se vê na mídia eletrônica. Fáceis juras de consideração e amor que não passam da pele do momento. Uma obsessão por compensação material da ausência real que se tenta mascarar. Aflição pela falta de reconhecimento compulsório de dedicação, outro lado da carência. Não há mais regra de "almoço" em família. Não há mais roda de diálogo pessoal, só pela internet se tenta suprir a frieza das relações em reiteradas e frenéticas juras superficiais de afeição. Hoje vive-se o tempo do que tudo se pode, tudo se tolera. Vícios, horários, falta de disciplina, apenas para suprir ausências. A tolerância fica pertinente como compensação do vazio. Permitir é razoável, mas não de modo cabal. A luz iluminista é profícua, mas demais ofusca. A vaidade vai imperando e vale qualquer coisa para se omitir defeitos, tão humanos. Deste modo o mundo vai se tornando impessoal, feição de robô que não erra, sem cor, sem amor, sem miolo, sem sentido. O egoísmo impera. Segue-se assim perdido. Os que tentam reagir ficam sem forças diante de um tsunami social em sentido oposto. Tudo é da fantasia. O deixai fazer deixai passar não pode ser absolutista, há de ser relativizado. Ainda que timidamente, como semente, há que se ressurgir o esforço pela consciência da vontade daquele tempo em que se dizia: bênção pai, bênção mãe...

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