ARTICULISTAS

A construção de nossos castelos

Ouço na voz de Gal Costa: Meu castelo de carinhos

Terezinha Hueb de Menezes
Publicado em 22/06/2014 às 11:53Atualizado em 19/12/2022 às 07:12
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Ouço na voz de Gal Costa: “Meu castelo de carinhos/ Eu nem pude terminar/ Momentos meus/ Que foram teus/ Agora é recordar...” Nisso consiste nossa vida: construir castelos de sonhos (ou seriam sonhos de castelos?). Construímos sempre.

Inacabada, como o próprio ser humano, é a construção de vida de cada um. Parecemos formigas, na mesmice, talvez irracional, de cumprir sempre a mesma trajetória: o cotidiano compõe-se da busca incessante de construir; construir prestígio, construir fortuna, construir projetos que nunca chegam ao fim.

Na caminhada pela vida, vamos edificando castelos, espelhados em sonhos. Nem sempre, porém, conseguimos executar o projet muitas vezes o tempo se apresenta mais veloz que nossas mãos; e ainda temos que lidar com os tropeços que nos impedem a consecução do ideal.

O mar da existência arrasta, principalmente, os castelos de carinhos que julgamos eternos e definidos: em ondulações inesperadas, arrasta para o seu bojo o que julgamos nossa propriedade – só então percebemos que o sonho jamais se concretizará.

Perdemos, com isso, momentos preciosos – porque a vida se faz de momentos – momentos que nos pertencem e ao ser amado, momentos que se misturam na identidade de dois seres: “momentos meus/ que foram teus”. E, de repente, estes momentos desaparecem.

Não é de se estranhar, na verdade, que de seres incompletos, como nós todos, humanos, surja tanta incompletude. Não adianta que nos enganemos a cada dia, crendo na eternidade de dias, meses, anos..., crendo, enfim, que veremos, todos os dias, o sol, encontrando-nos do mesmo jeito, a noite acalentando esperanças que sempre acreditamos factíveis.

Ingenuidade maior acreditar que, nesta vida terrena, a que somos tão apegados, esteja o verdadeiro fim do homem. Ingenuidade porque, a cada momento, tomamos consciência, querendo ou não, da transitoriedade das coisas. Vão-se momentos, cada minuto vivido não volta jamais...

De tudo, resta recordar. Recordar momentos de amor, porque permanecem na alma. E o que está na alma, isso, sim, se eterniza, como o próprio espírito “que não envelhece”. Recordar palavras de ternura, que o mar da vida não conseguiu apagar. Vindas do nosso interior, elas permanecem na memória: “O que a memória ama, fica eterno.”

Mas recordar tem gosto de saudade. Lembrar o que se foi. Olhar o castelo ainda sem terminar e perceber que não há como retomar sua edificação.

Talvez castelos também tenham alma. Talvez à moda do ser humano, em algum outro lugar, haja o espírito das coisas, de momentos que não poderiam jamais se perder no redemoinho do tempo. E, de modo especial e diferente, possa a construção dos nossos castelos, mesmo que em forma de esgarçadas nuvens, retomar sua forma e servir de moradia de sonhos – em determinado tempo e espaço considerados, para muitos, impossíveis.

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