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Telefone celular

Até poucos anos, não havia este pequeno aparelho portátil de comunicação

Dom Benedicto de Ulhôa Vieira
Publicado em 21/07/2011 às 20:31Atualizado em 19/12/2022 às 23:15
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Até poucos anos, não havia este pequeno aparelho portátil de comunicação, a que se deu aqui o nome de celular. Foi rapidamente crescendo o seu uso em muitos países e também entre nós, no Brasil. Homens de negócios, jovens estudantes, profissionais como médicos e engenheiros, padres e até seminaristas que se sentem com necessidade de não restringir seus relacionamentos entre quatro paredes da casa de formação, todo o mundo possui um. De fato, há momentos em que um celular “quebra o galho”, como quando o carro encrenca numa estrada ou uma filha precisa chamar o pai para ir buscá-la. Mas o uso facilitado parece ter-se tornado, em muitos casos, verdadeiros abusos. Não só nos teatros e nos cinemas, mas também nas igrejas, em plena celebração de casamento, somos incomodados pela indiscreta chamada de um celular. E torna-se, em alguns momentos, reprovável falta de educação. Exemplos não faltam.

Vem a pessoa tratar de assunto particular com o sacerdote e, durante a audiência, abre a bolsa ou tira do cinto o aparelho para atender a quem lhe queira falar. Numa destas visitas, suportei a interrupção do atendimento pastoral por três vezes, para que a pessoa atendesse aos chamados de seu celular. Na terceira, pedi que desligasse o aparelho para que nossa entrevista não ficasse prejudicada. Já tive o desprazer de, em aula, ver o aluno sair apressado da sala para atender, no corredor, o chamado do seu aparelho. Inaceitável!

Nas salas de espera dos aeroportos, é comum ouvir quem tome decisões ou dê orientações de negócios, em voz alta, por evidente necessidade de exibição. À beira das piscinas, nos clubes e nos hotéis de descanso, trançam de lá para cá, ouvido colado ao aparelho, os que, ao lado dos que tomam sol e repousam dos seus trabalhos, se sentem no direito de se comunicar com suas empresas, como se fossem decisões inadiáveis. Já é impossível ser importante – ou parecer sê-lo – sem ter um celular na cintura e usá-lo continuamente.

Um jornal francês trouxe, há alguns anos, dois longos artigos, um de psicólogo, outro de sociólogo, analisando a necessidade das pessoas de viverem grudadas ao pequeno aparelho e usá-lo em quase todo momento. Para o sociólogo a explicação é de a pessoa nunca conseguir desligar-se de seu trabalho e de suas atividades. Incapaz de parar, de fazer uma pausa, de cuidar de outra coisa que não seja algo ligado aos seus afazeres. Para o psicólogo, o uso constante do celular pode explicar-se pelo temor de se sentir sozinho. Precisa estar sempre em comunicação, sentir-se sempre ligado e acompanhado, falando e ouvindo. Há como que uma fobia de se sentir só, um medo de encontrar-se consigo mesmo, uma neurose de isolamento. A estas duas possíveis explicações, poder-se-ia acrescentar a busca de certo prestígio em possuir um celular e exibi-lo. Dá “status”.

É claro que o progresso da técnica trouxe algo de útil, sobretudo ao médico que deve salvar vidas, ao viajante que deixa um parente enfermo em casa, às pessoas que exercem funções de alta responsabilidade social. Seria insânia negar a utilidade desse fácil meio de comunicação.

O de que se está tratando aqui é da compulsiva necessidade de possuir e usar um celular, como que – sem isto – a pessoa se devesse considerar inferior, carente, marginalizada. É moda. E moda é sempre algo de despótico.

Os romanos sabiam dizer as coisas sérias e profundas em poucas palavras. É deles a sentença: “Datur modus in rebus”, cujo sentido é: em todas as coisas deve haver certa moderação. É esta moderação que se está proclamando aqui e em outros muitos casos da vida cotidiana.

(*) Membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro

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