ARTICULISTAS

Um legado de honra

Há pouco mais de um mês, perdemos um jovem paulista, uberabense de coração

Mário Salvador
Publicado em 29/04/2019 às 22:05Atualizado em 17/12/2022 às 20:19
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Há pouco mais de um mês, perdemos um jovem paulista, uberabense de coraçã José Luiz Cavalcante de Oliveira, o “Zé”. Nós, amigos, nunca tivemos dúvida de sua bondade, mas foi só postumamente, encontrando sua família, que nos demos conta de que, muito mais que bom, o Zé era realmente um exemplo.  Em nome de sua memória, deixo um pequeno compilado de suas ações admiráveis, que espero que sejam referência especialmente aos homens. 

Quando o Zé tinha dez anos, ele e outros colegas receberam uma advertência na escola, e foram chamados a uma reunião. Nela, a supervisora elaborou uma carta e disse que os alunos deveriam assiná-la. Diante de colegas inseguros, o Zé manifestou que só assinaria a carta caso concordasse com seu conteúdo. Numa conversa particular com a mãe dele, a supervisora explicou que aquele foi um ato muito firme para alguém tão novo.

Ele sempre foi fiel e respeitoso, sem um pingo de machismo. Numa das ocasiões em que quis terminar um namoro, esperou a namorada voltar de viagem de uma cidade praiana, pois ele “não queria estragar aquele momento feliz”. Porém minha história preferida é a da vez em que ele se hospedou na casa de uma ex-namorada, conheceu o atual namorado desta, ficou amigo dele e, mais que isso, fã. Ele ostentava com orgulho o CD gravado por esse rapaz e tinha ficado sinceramente feliz de conhecê-lo e saber que o namoro dos dois ia bem.

Aliás, mesmo depois de um término, o Zé andava quilômetros para buscar o cachorro que havia dado para a namorada e passear com ele. E há três anos, adotou um enorme rottweiler que parecia sofrer maus-tratos e precisava de muito carinho.

Na última cidade em que morou, o Zé já era querido por todos. Não por menos. Ele dirigia para o colega de trabalho que tinha uma limitação física e estava esperando a adaptação de um carro ser concluída. Às vezes, isso envolvia levar o colega a uma fazenda distante daquela a que o Zé teria de ir depois. Findo o dia de trabalho, o Zé buscava o colega na fazenda e o levava para casa.

E ele era muito cuidadoso com a direção. Deixou sua faxineira maravilhada com um longo passeio de carro em que a levou. Um dia, outro amigo do Zé ficou sem carro. Prontamente, o Zé ofereceu o dele próprio. Quando o amigo lhe devolveu, o Zé comentou animad “Mãe, você viu que ele até lavou meu carro?”.

Em tão pouco tempo, ele foi chamado para tocar em todas as missas da igrejinha da nova cidade. Um senhor comentou que só tocava violão fazendo um blam-blam-blam, mas depois de conhecer o Zé, ele viu o que era tocar violão fazendo tududurutu tatatutum. E o Zé era o único que sabia tocar guitarra naquela cidade. E, mesmo não gostando de música sertaneja, ele amava os sertanejos a quem visitava todos os dias, e em nome deles, já estava aprendendo uns modões para tocar nos almoços.

Seu compromisso com a melhoria da vida das pessoas era enorme. Um dia pagou uma dívida de uma guitarra para um amigo e, por isso, ficou com o instrumento. Porém o amigo sempre passava na casa do Zé para pegar a guitarra emprestada. Da última vez em que o Zé esteve em Uberaba, quando sua mãe notou a ausência da guitarra em casa, o Zé explicou: “Mãe, deixei com ele para sempre. Ele precisa mais que eu.”

Quando seus pais passaram pela prefeitura da cidadezinha, tiveram uma última surpresa. O Zé havia elaborado um projeto de ensinar karatê para crianças de rua. Ele era faixa preta em karatê e em jiu-jitsu, mas sua maior luta era fazer o bem. O projeto já havia sido aprovado e o Zé já havia comprado o tatame.

O Zé tinha amigos de todos os tipos, e não se cansava de fazer novos amigos. A maioria de seus atos de amor fraternal nunca foi anunciada ou publicada. Entre o caminho fácil e o difícil, ele sempre escolheu o caminho correto, conforme aprendeu com sua querida família: dona Lúcia, senhor Zé Luiz e a irmã Mariana. Infelizmente, não deu tempo de o Zé chegar ao seu último aniversário – o dos 30 anos. Mas nesses dias de luto, tivemos uma metáfora perfeita: o aniversário dele foi no Domingo de Páscoa. 

Maria Luísa Leal Salvador Caetano

Amiga do José Luiz

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