POLÍTICA

A mulher que deverá dar mais sensibilidade à Fiemg Regional

Jornal da Manhã traz entrevista com Elisa Gonçalves Araújo sobre os planos da nova gestão para a Fiemg Regional

Thassiana Macedo
Publicado em 24/06/2018 às 12:20Atualizado em 17/12/2022 às 10:56
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Presidente do Sindicato da Indústria de Calçados de Uberaba (Sindcau) desde 2013, diretora do Cigra e parceira do pai, Domingos Sávio, na Levfort Indústria de Calçados e Solados, Levfort Transportes e Hotel Jaguar, a empresária Elisa Gonçalves de Araújo foi eleita vice-presidente da Fiemg Regional Vale do Rio Grande, para o período de dois anos, com a proposta de trazer renovação a este braço da entidade. A função será desempenhada com a diretora Miria Rezende, presidente do Sindicato da Indústria de Material Plástico de Uberaba (Sindiplast) desde 2012, que também dirige a Displas - Distribuidora de Sacos Plásticos e compartilha a gestão da Plasticeres Industrial com o marido, Helbert Ferreira Higino de Cuba. As duas terão o apoio do diretor Luiz Alberto Balieiro, vice-presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Planalto de Araxá (Sinduscon-PLA), e uma difícil missão pela frente. Na edição de hoje o Jornal da Manhã traz entrevista com Elisa Gonçalves Araújo sobre os planos da nova gestão para a Fiemg Regional, que vive a expectativa de uma redução drástica nas receitas do Sistema S.

Jornal da Manhã – É a primeira vez que duas mulheres assumem os mais importantes cargos de direção da Fiemg Regional Vale do Rio Grande. O que isso representa?

Elisa Gonçalves Araújo – Representamos um pouco mais de sensibilidade para este universo sempre dominado pelos homens. Enxergo também que os próprios homens abriram mão do tradicional e quebraram tabu em aceitar as mulheres, visto que fomos eleitas. Não chegamos aqui por indicação e fomos eleitas por muitos homens, porque enxergaram em nós uma representatividade. Considerando o aspecto feminino, acredito que trazemos sensibilidade e multidisciplinaridade.

JM – Com o avanço da mulher no mercado, elas respondem por 44% dos trabalhadores brasileiros, mas a participação vai caindo de acordo com o nível hierárquico. Conforme pesquisa do IBGE, as mulheres representam 37% dos cargos de direção e gerência, sendo que, no topo de grandes empresas, elas são apenas 10%. Além disso, em média, a mulher ganha 76% do salário dos homens. Como a senhora vê essa situação?

Elisa Araújo – Enxergo isso como uma questão de desigualdade, sim, mas também observo que estamos [Elisa Araújo e Miria Rezende] puxando uma fila. Acredito que estamos sendo uma referência para outras mulheres também se sentirem empoderadas, ou seja, se sentirem capazes de também poder conquistar esses cargos. Em geral, acredito que estamos passando por uma fase de mudanças. Além de mulheres, somos mais jovens do que a maioria dos nossos antecessores. Então, acredito que é um momento de mudança, mas que está sendo bem aceito. Ainda existem algumas barreiras, mas nós vamos enfrentar e vai ser tranquilamente.

JM – A oposição foi eleita para comandar a Fiemg com a proposta de renovação. Que espécie de renovação será efetivamente implementada, não apenas no Estado, como em Uberaba também?

Elisa Araújo – Pretendemos fazer uma gestão compartilhada, ou seja, uma gestão horizontal, na qual não vai haver domínio hierárquico. Vamos trabalhar de maneira bem horizontal e com muita participação de todos. Nossa maior meta é promover o engajamento dos presidentes dos sindicatos nas nossas propostas, que é a participação da sociedade e do empresariado, para que todos entendam que se uma indústria é afetada, isso vai refletir na vida de todos.

JM - Nesse processo estão incluídos demissões, enxugamento dos quadros e das despesas e outras medidas consideradas “amargas”?

Elisa Araújo – Na verdade, o Sistema S passa por um momento de redução da arrecadação e o provável fim do compulsório [criado na década de 1940 para incentivar a industrialização do país, o Sistema S - Sesi, Senai, Sesc, Senar, Senac, Sest, Senat, Sebrae e Sescoop - recebe repasses do governo, compulsoriamente arrecadados das empresas, com a missão de oferecer qualificação profissional, educação, cultura e serviços de saúde e lazer para os trabalhadores]. Enxergando isso, o Sistema S está se preparando. O nosso novo presidente [da Fiemg], Flávio [Roscoe], tem uma visão gestora estratégica focada especialmente na eficiência e redução de custos e, obviamente, isso reflete em alguns cortes, sim. Mas o objetivo principal é trazer o máximo de eficiência com o menor custo. As mudanças incluem também essa questão estrutural e de gestão, da casa inteira, não só da nossa regional, mas de todas as regionais do Estado e do próprio Sistema S.

JM – Aqui, na Regional Vale do Rio Grande, a senhora já sabe se há alguma meta a ser cumprida? Há algum planejamento?

Elisa Araújo – A grande meta é tornar as regionais e a própria sede sustentáveis. A conta precisa, pelo menos, empatar, e não podem gerar prejuízos. Essa é a meta, em números, que o Flávio Roscoe tem e, consequentemente, é a nossa meta aqui na regional também. A nossa regional tem uma cultura de não focar as receitas, estando mais voltada aos serviços ao empresariado e aos sindicatos. Enxergando esse cenário diferente, de redução de arrecadação, observamos que devemos tratar melhor dessa questão das receitas. Para sanarmos os números, pretendemos trazer uma fonte de receita maior para cá. Vamos fazer uma reestruturação do pessoal e vamos colocar alguns espaços do nosso prédio para locação à sociedade. As demissões já foram feitas antes que nós entrássemos, por diretrizes do Flávio, com base em uma análise feita por uma consultoria contratada pela Fiemg. Então, não foi uma decisão nossa.

JM – Nos últimos meses, os grandes grupos empresariais brasileiros, como JBS e Marfrig, se viram envolvidos em escândalos diversos, manchando a imagem da indústria nacional. Acredita ser possível recuperar a credibilidade do nosso parque industrial?

Elisa Araújo – Creio que sim, pois acredito que existam muito mais empresários bem-intencionados e corretos, lutadores e que pagam seus impostos em dia. Há muito mais pessoas que fazem todo o processo correto para serem bons empresários do que os que não o fazem. Vamos construir essa imagem quando conseguirmos comunicar com a sociedade e essa é uma das nossas propostas à frente da Regional Vale do Rio Grande. Comunicar com a sociedade, por entendermos que, juntos, nós conseguiremos mudar essa imagem e lutar contra pessoas que fazem as coisas de maneira ilegal. Todos fomos prejudicados, ou seja, os empresários, porque ficaram com a imagem manchada, e a sociedade, porque pagou a conta.

JM – Como melhorar a nossa imagem no exterior?

Elisa Araújo – Melhorar a imagem da indústria brasileira lá fora para ter a confiança do investimento e do produto brasileiro não é fácil. Recentemente, dentro do setor de calçados, à frente do Sindcau (Sindicato da Indústria de Calçados de Uberaba), nós desenvolvemos uma missão empresarial no Uruguai. Levamos dois anos para estruturar essa missão e capacitamos as empresas. O mercado uruguaio é pequeno, mas era um local próprio de experimentar a exportação para pequenas empresas. Fomos até lá, montamos um showroom e vendemos, mas a hora de despachar caiu bem na época da paralisação dos caminhoneiros. A mercadoria ficou parada 15 dias na estrada. Preocupei-me muito com a imagem que meu comprador teria da minha empresa e do Brasil. Felizmente, eles [uruguaios] acreditam no nosso potencial e sabem que o problema não foi nosso, mas não acredito que seria a mesma visão de um comprador dos Estados Unidos. Essa imagem só vai mudar quando todos aderirem à campanha, liderada pelo presidente da Fiemg, de enxugar o Estado. Quando nos unirmos para que o Estado reduza custos e seja mais eficiente, como nós estamos fazendo na nossa própria casa, acredito que melhoraremos a imagem. Isso é em longo prazo, mas creio que é o caminho. Assim, não haverá a desculpa de aumentar impostos porque não tem dinheiro para pagar a conta. Só vamos conseguir eficiência quando reduzirmos a máquina que hoje está inchada.

JM - Quais são os principais entraves para o crescimento das empresas e a competitividade da indústria brasileira no mercado internacional?

Elisa Araújo – Temos altos juros, uma burocracia enorme e impostos altos e creio que tudo isso impacta na competitividade. Acredito também que a maneira como o setor produtivo brasileiro se movimenta também complica. O governo federal lançou um projeto chamado “Produção Mais Enxuta” e, junto com a Fiemg, levamos orientação para dentro das indústrias. Com isso, enxergamos que com pequenas alterações conseguimos produzir mais, com maior rapidez e melhor. O setor produtivo precisa passar por uma reestruturação. Como nós precisamos estudar e cada dia aprender mais, o setor produtivo também precisa ter um olhar mais eficiente para a gestão, para o pátio industrial. Ali conseguimos reduzir custo e melhorar a competitividade. E o Estado, enquanto poder público, também precisa fazer a mesma tarefa, reduzindo a burocracia para investimentos e a corrupção.

JM – O Brasil figura no ranking mundial dos países que mais cobram impostos e, por isso, o empresariado defende, sem sucesso, uma ampla reforma tributária. Quais seriam os principais itens que deveriam ser atacados para reduzir o peso dos impostos sobre as empresas e sobre os cidadãos?

Elisa Araújo – O ICMS, por exemplo, é um em Minas Gerais, é outro no Nordeste, ou seja, em cada Estado ele é aplicado com um percentual diferente. Acredito que ele deveria ser igual e vejo esse como um dos pontos chave para a reforma. Os demais vão variar de acordo com o setor produtivo, mas o que mais impacta na indústria, na minha avaliação, é o ICMS. Hoje, no caso da minha tabela de preço, no meu setor, preciso fazer uma para cada Estado. E varia muito, com diferenças muito grandes de valor. Acredito que, conseguindo isonomia na questão do ICMS, já teríamos um grande avanço.

JM – Inclusive, essa questão da isonomia de alíquotas de impostos entre os estados foi levantada com a paralisação dos caminhoneiros, que pararam o país em um movimento que escancarou as diferenças tributárias entre os entes da Federação como um dos principais entraves à redução do preço do combustível para os consumidores. Essa disputa entre eles é saudável para a economia?

Elisa Araújo – Acredito que não. Trazer essa isonomia entre os estados é importante, porque não vejo como algo benéfico essa questão de competir dentro do próprio país. Temos que pensar em competir com outros países, não aqui dentro. Internamente, nós temos que andar juntos.

JM – Nos últimos dois anos o Brasil vive uma crise econômica sem precedentes na história recente da República. Como líder classista, a senhora vê alguma luz no fim desse túnel?

Elisa Araújo – Procuro sempre enxergar o lado positivo. As crises são benéficas, porque elas fazem a maioria das pessoas sair da zona de conforto. Quando saímos da zona de conforto, visualizamos novas possibilidades. Justamente no auge da crise, muitos acabaram fechando as portas, voltando para o mercado de trabalho, ou muitas pessoas foram demitidas e se tornaram empreendedoras. Encontravam-se em situações em que não havia o que fazer e era preciso se virar. Então, há muitos “cases” de sucesso porque saíram da zona de conforto e se redescobriram outros profissionais. Isso proporcionou ao mercado profissionais mais qualificados, interessados e comprometidos, algo que não tínhamos antes. No momento do auge econômico, tínhamos uma grande demanda por mão de obra e não encontrávamos qualificação e comprometimento, promovendo uma grande rotatividade, o que não é bom para a indústria e para nenhuma empresa. Claro que existe o lado negativo, mas acredito que quem soube levar a situação de uma maneira mais positiva saiu ou está saindo da crise melhor do que quando entrou.

JM - Acha que as eleições de outubro poderão dar novos rumos à economia brasileira?

Elisa Araújo – É um momento delicado, porque temos uma grande incerteza até dos próprios governantes. Não sabemos quem serão os candidatos de fato, mas tenho grande preocupação com o modelo radical que muitos defendem. Não acredito que o radicalismo vai nos levar a alguma solução. Creio que, enquanto sociedade, temos que aproveitar esse período para nos movimentar, entendendo nosso papel nesse momento na escolha e na cobrança. Não sabemos quem vai ser eleito, mas, seja lá quem for, temos que cobrar por um Estado mais eficiente e mais enxuto. Sigo essa tendência porque é o que estamos fazendo aqui na Fiemg, em casa e na nossa empresa, porque no final somos nós que pagamos o imposto. Então, que ele seja destinado da melhor forma e que o custo da máquina pública seja mais enxuto. Temos uma incerteza muito grande sobre o que será, mas enquanto sociedade nós temos que cobrar isso e não acredito que radicalismo vai resolver.

JM – Qual o modelo de gestão que a senhora acredita ser o mais viável para o país?

Elisa Araújo – Mais eficiente e mais enxuto. Aliás, o Fábio Roscoe defende o fim da estabilidade do funcionário público. Acredito que essa é uma importante bandeira. Se uma pessoa não é eficiente, por que ela deve ter estabilidade? Um funcionário público precisa ter o mesmo comprometimento do privado e ser eficiente, tem que gerar resultado.

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