A graça da vida está nos detalhes. Coincidências e pequenos acontecimentos corriqueiros que passariam despercebidos tornam-se interessantes, engraçados e motivos de reflexão, se bem observados. Foi o que aconteceu comigo quando fui reorganizar meus armários após uma reforma. Nessas ocasiões achamos coisas que nem sabíamos que tínhamos, doamos outras tantas e damos falta de itens que jurávamos possuir. Arruma daqui, muda dali e eis que me deparo com uma borracha. Antigamente usávamos dois tipos de borrachas: as brancas, para apagar escritas a lápis, e as de duas cores, para apagar escritas a tinta. A minha era branca. Olhei para ela por um tempo, matutando se valia a pena guardá-la ou não. Optei por jogar fora, tal o seu desuso ao longo do tempo.
Eis que, lendo o Jornal da Manhã do dia 18 de junho, me deparo com uma matéria descrevendo os itens objeto de uma licitação da Câmara Municipal de Uberaba para materiais de escritório, pelo período de 12 meses, e entre eles, 400 borrachas duas cores ao custo de R$0,27 cada. Nossa, pensei! Joguei uma borracha fora e não é que ela é útil? Pelo menos faz parte das necessidades dos nossos vereadores. Fiquei intrigada. 400 borrachas, e elas duram tanto... Consultei pelo Portal da Transparência outros processos licitatórios e vi que eles possuem computadores, notebooks, compram toner, impressoras, etc. Mas não abrem mão das borrachas. Interessante.
Dando asas à imaginação, resolvi, apenas como exercício de raciocínio, e dada à ironia de eu ter jogado fora minha borracha, sugerir coisas que deveriam ser apagadas por eles. Começando pelos inúmeros projetos inconstitucionais que são apresentados ao longo do ano e que só servem para ser vetados pelo Executivo e dar ao contribuinte a ilusão de um ritmo intenso de trabalho. Sem esquecer a série de requerimentos que demandam sessões inteiras para ser lidos e aprovados em plenário, muitos deles desnecessários. Apagar, quem sabe, assessores que se mostrassem ociosos, restituindo à Prefeitura a verba de seus salários e benefícios para ser usada em áreas carentes. Apagar atrasos, descasos com os eleitores, agressividades desnecessárias, viagens sem resultado, mordomias e privilégios. Deixar apenas impressas boas ações e, em relevo, as verdadeiras funções do Poder Legislativo, de propor leis de interesse público e fiscalizar os atos do Executivo. São muitos os vereadores imbuídos desses propósitos. Só precisam sobressair, porque a memória do eleitor nem sempre pode ser apagada.
