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E agora, José?

Ele tinha apenas 21 anos. Era judeu e os judeus se casam nesta idade. Ela não completara

Padre Prata
Publicado em 18/03/2018 às 12:14Atualizado em 16/12/2022 às 05:30
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Ele tinha apenas 21 anos. Era judeu e os judeus se casam nesta idade.  Ela não completara ainda dezesseis anos. Duas crianças inexperientes. Vinham de longe. Do norte. De uma província paupérrima, cortada de rochas, sol de deserto e calor sem fim. Desciam para o sul desconhecido. Jornada de quase cem quilômetros. Cinco dias de viagem, talvez um pouco mais. Tudo dependia dela, que estava grávida. Descansavam nas pequenas estalagens que pontuavam à beira da estrada. Ali encontravam água, vinho, bálsamo, pão e azeite. Aquela gravidez inesperada preocupava aquele jovem sem saber o que fazer. Tempos atrás, ao saber daquela “novidade”, tentou abandoná-la. Uma dúvida doída ainda o atormentava. Filho de quem? Os amigos comentavam. O lugarejo onde moravam era pequeno. Duzentas casas, se tanto. Os parentes escandalizados não sabiam o que pensar: “Será que José não está percebendo nada?” A menina se fechava num silêncio, sem lógica. O certo é que José aceitava aquela situação. Ninguém sabia por quê.  Falavam num sonho que ele tivera e confiara aos mais íntimos. Mesmo assim ninguém entendia. Sonho? Seria coisa de Deus, como dissera? Mas, será verdade que Deus nos diz coisas em sonhos? Ela já estava bem gordinha, perto dos nove meses.  Por que estavam naquela caminhada tão difícil? Cumpriam a vontade de um político vaidoso procurando saber em quantas pessoas ele mandava.  Cada um se recenseasse na cidade de onde vieram seus ancestrais. Por isso procuravam Belém. A cidade estava atravancada de gente de fora. Centenas de pessoas. As hospedarias lotadas. Uma, duas, três, cinco, dez, não havia lugar para eles. Faltava apenas uma, perdida entre tamareiras num fim de rua. Aqueles dois jovens se entreolharam. “E agora, José?” – “Vamos tentar, Maria, não se desespere.” Sentiram o mundo desabar quando ouviram aquelas três palavras: “Não há lugar.” Descem a escadaria que os levara ao segundo andar. As dores aumentam: “José, não aguento mais, ele vai nascer. Me ajude, por favor.” Só lhes resta uma porta. A porta da estrebaria. Empurram-na. Cheiro nauseante de urina, de amônia, montes de estrume. Feno empapado pela baba dos animais que ali se amontoam. Cabras, carneiros, ovelhas, bodes, jumentos, se atropelam. Aquelas duas crianças sentem engulhos naquele lugar sufocante. José não sabe o que vai acontecer nem o que vai fazer. Procura um monte de palha. Faz deitar ali sua bem-amada. Um mundo de ternura. As dores são irresistíveis. O grito. Parece que o mundo explode em mil pedaços quando nasce ali, naquele momento, o Filho de Deus.  “Meu Deus, como cortar aquele cordão? Como separá-lo da mãe?” Não há água para lavá-lo nem panos limpos para cobri-lo. Tantos detalhes nos são ocultos. Não nos contaram tudo. Drama revelado em gotas. Diziam que alguns pastores que andavam por ali notaram sinais estranhos. Alguns chegaram a dizer que ouviram anjos cantando. Foram correndo até lá. O que viram? Um menino enrolado em trapos. Ficaram sem saber do que se tratava e foram contar aos outros o que viram e ouviram. Todos estavam assustados.

Só nós, hoje, não nos assustamos mais. Achamos tudo isso coisa muito natural. Coisas do passado. Coisas que não tocam mais os nossos corações. Coisas que não transformam mais as nossas vidas. Não significam mais nada. Importante é a figura pagã do Papai Noel. Ele não nos traz nenhuma mensagem. Nenhum projeto de vida. Apenas um saco de brinquedos para que continuemos a festejar nossa falta de Fé.

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