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Como depenar o ganso

Escrever para um jornal deve ser tarefa pensada em agradar aos leitores, dando-lhes matérias

Solange de Melo M. N. Borges
Publicado em 15/12/2017 às 19:38Atualizado em 16/12/2022 às 08:11
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Escrever para um jornal deve ser tarefa pensada em agradar aos leitores, dando-lhes matérias interessantes e, principalmente, novas. No entanto, quem escreve sobre questões financeiras e econômicas tem, quase sempre, assuntos graves para tratar. Ao nascer o debate na sociedade, é imperativo buscar ilustrar, desvendar, explicar ou criticar, para o maior esclarecimento de todos quantos forem os leitores. E olhe que o nosso dia a dia tem fatos mais extraordinários que a “desolação da Babilônia”!

É Natal, tempo de confraternização e presentes!  Mas, milhões de brasileiros, esses que ganham acima de R$1.903,00 mensais – que, convenhamos, chamar de renda um valor tão irrisório é uma aberração –, estão travando uma batalha cerrada para arrebanhar papéis, recibos, comprovantes, notas e informes de rendimentos para o confronto com o Imposto de Renda, ou seja, com o Leão, símbolo que diz tudo sobre a ferocidade dos arrecadadores. Em momentos de profundo sono, deixa passar fortunas incalculáveis sem qualquer ânimo para o ataque.

Atualmente, no Brasil, existem quatro alíquotas para servirem ao cálculo do imposto, de acordo com a faixa de renda: 7,5%, 15%, 22,5% e 27,5%. A tributação começa com níveis muito baixos de rendimentos, sacrificando enormemente o maior número de contribuintes. Um bom sistema tributário deve ser justo. E o sistema brasileiro não é. Como se não bastasse, a tabela é corrigida anualmente, muito abaixo da inflação. No ano de 2016, houve um aumento de 5% nos limites de isenção, o que deveria alargar esses limites. Porém, esse valor corresponde apenas à metade da inflação verificada no período, o que equivale a dizer que, além de perder poder aquisitivo com o processo inflacionário, ainda, provavelmente caiu numa alíquota maior o que aumenta a defasagem entre o imposto e a renda real do cidadão. Nesse caso, um sistema tributário mal preparado para lidar com os efeitos da inflação ou bem preparado para ganhar com a inflação merece a culpa. Eu diria mais: em seu propósito não declarado, caracteriza-se um governo desonesto e irresponsável, principalmente com a chamada classe média, a “classe produtiva” que se vê esmagada, espoliada e inconformada com o sistema tributário, que lhe toma tudo!

Reza a teoria econômica que Arthur B. Lafer, economista americano, ao desenhar num guardanapo de restaurante a curva resultante da receita tributária para cada alíquota de imposto, resultou na Curva de Lafer – uma relação entre receita tributária e alíquota tributária, da seguinte forma: a curva mostra a receita tributária arrecadada para cada alíquota de imposto (ou para a totalidade das alíquotas). Ela ilustra a situação em que reduções tributárias podem estimular a economia pelo lado da oferta, o que, por sua vez, expandiria a base tributária.

Num primeiro raciocínio, após a tempestade da teoria, surge uma frase bastante elucidativa do assunt “Dai-me boa política e eu vos darei boas finanças”. Então, não há como ser diferente mesmo, governos oligárquicos, especialistas em excessos de gastos e afrontas à sociedade com o uso abusivo do nosso suado dinheirinho, nenhum argumento pró aumento de imposto terá qualquer apreciação positiva.

Enfim, com base no princípio da capacidade de pagar, na área da tributação, que também pode ser chamado o “princípio do sacrifício igual, só nos resta compartilhar com o Ministro francês lá dos idos de 1600: “A arte da tributação consiste em depenar o ganso de modo a obter o maior número possível de penas, provocando um mínimo possível de grasnidos.” (Colbert, J. B.)

(*) Economista, especialista em Teoria Econômica (PUC/MG)

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