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Dos biscoitos de polvilho à era do compartilhamento

Por SMS, o pai comunica ao filho

Mário Salvador
Publicado em 23/04/2013 às 19:45Atualizado em 19/12/2022 às 13:28
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Por SMS, o pai comunica ao filh “O almoço está na mesa. Venha almoçar.” E o filho está no quarto contíguo à sala de jantar. Sinal dos tempos. Pode parecer que essa história só tem o lado negativo, porém todo esforço dos mais velhos para acompanharem a modernidade é compensador.

Em outras épocas, famílias se visitavam e conversavam sobre assuntos de interesse comum. As visitas obedeciam a um protocolo, segundo o qual, lá pelas tantas, era servido café coado na hora, acompanhado de biscoitos de polvilho, mais bolachinhas e bolo, especialmente feitos por uma dedicada dona da casa. Depois era preciso pagar a visita, expressão substituída pelo verbo retribuir. Visita feita e visita paga, a vida continuava.

Os mais novos também faziam visitas. Partilhavam assuntos do moment namoros, noivados, compromissos, estudos, família, viagens... Amigos são bons confidentes. E amizades se solidificam a cada encontro.

Mas a juventude se modernizou. Quatro amigos marcam encontro em local público. Chegam ao local combinado e sentam-se às mesas. Pegam seus celulares de última geração. Colocam em dia as mensagens e passam a brincar com algum jogo especial pela internet, em que trocam vidas entre si. Até mandam mensagens uns para os outros, mesmo estando próximos fisicamente. E as enviam também para os que não participam da reunião.

Tive, recentemente, uma prova de como a internet domina a situação. Uma de minhas filhas postou na internet uma foto que ela fez de um arranjo com rosas brancas e vermelhas, que colhi no meu quintal. Outra filha chegou à minha casa, sentou-se à mesa onde estava o arranjo e comentou: “Vi a foto do vaso com as rosas na internet. Muito lindas!” Não percebeu, entretanto, as rosas bem à sua frente. A internet permitiu que uma vida efêmera como a das rosas fosse apreciada por amigos que não teriam tempo de aparecer em minha casa enquanto elas estivessem no vaso.

Estamos, realmente, num mundo novo, bem diferenciado. A correria é flagrante; não se pode perder tempo; é preciso agir rápido. E a internet é um excelente meio de comunicação, especialmente para grandes distâncias e tempo curto. É possível conhecer cada rua de um lugar qualquer, para o qual queiramos nos mudar, por exemplo, antes de irmos a esse lugar. E reservar lugar no hotel, comprar passagens, ingressos de espetáculos. É possível conhecer e comprar produtos, bem como conhecer músicos, artistas e outros profissionais, que hoje têm facilidade em divulgar seus trabalhos... Compartilhar o conhecimento, resgatar o passado, divulgar fotos de pessoas desaparecidas, conhecer suspeitos procurados pela polícia e ajudá-la e encontrá-los, achar pessoas com quem há muito perdemos o contato, participar de festa ou velório, mesmo sem estarmos lá fisicamente. É a era do compartilhamento. E todos querem se ajudar mutuamente.

A internet se tornou a principal forma de manter pessoas em sintonia umas com as outras. E visitas se tornaram uma alternativa. E, por isso mesmo, os encontros pessoais têm sido muito mais valorizados. Quando amigos aderem àquela brincadeira de empilhar os celulares sobre a mesa, no início de um encontro (e o primeiro a não resistir e pegar o seu é que paga a conta de todos), o foco da reunião passa a ser a pessoa.

Admiro amigos que ainda fazem visitas como nos velhos tempos e compartilham delícias que escolhem nas confeitarias da cidade. Visita com tempo de tomar café feito na hora e apreciar biscoitos de polvilho é raridade. Quem tiver oportunidade como essa, aproveite-a: pode ser única. Mas não haverá perdão para quem não tentar aderir à modernidade.

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