ARTICULISTAS

Canhãe, canhãe...

Foi-se o tempo em que a música Eu não sou cachorro não

João Eurípedes Sabino
Publicado em 22/06/2012 às 20:25Atualizado em 19/12/2022 às 18:57
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Foi-se o tempo em que a música “Eu não sou cachorro não”, de Waldick Soriano, tinha a conotação de que ser cachorro era a pior coisa do mundo. Hoje temos exemplos de que os cães, morem eles nas ruas ou mansões, estão passando por dias melhores. Há, todavia, os que têm os cachorros como verdadeiros amigos e aqueles declarados inimigos, estes completamente fora dos padrões atuais. Vejamos:

Na porta de um prédio comercial vi uma pessoa dedicando sua atenção a certo vira-lata marrom-claro, orelhas grandes em abano, com corpo entre pequeno e médio. Estava ele sentado no início de uma rampa e com o olhar fixo no hall de entrada. A cada pessoa que saia dos elevadores, ele, que esperava, parecia falar: “Caramba! Aquela ainda não é a minha dona! Ufa!”.

Enquanto isso, o tempo passava e as pessoas, vendo a atitude daquele estático animal, iam acercando-o. De alisadas no pelo, chamados carinhosos de fofo a fotos de celulares, o cãozinho ganhava. O certo é que ele virou celebridade em poucos minutos. Fui a um banco e fiquei retido com várias pessoas na avenida Leopoldino de Oliveira, a esperar um carro-forte buscar ou levar dinheiro ali. Voltei e o dócil cão estava lá.

Apurei que a sua espera ali já passava de 40 minutos. Eis que, de repente, passa um “bom sujeito” e, com sua bota rude, solta sem dó um chute no animal. Isso foi o bastante para que a torcida o esconjurasse. Ao ver seu tipo country e sabendo ser ele responsável por algum rebanho bovino, alguém soltou a frase: “Esse, chutando sem motivo um cachorro, deve ser o tipo que tem coragem de envenenar o gado do patrão. É só ter o motivo”.

Um recadinh Você, que causou pânico ao cãozinho, fazendo-o correr para o meio da rua, expondo-o ao risco de ser morto pelas rodas dos carros. Você, que o fez, desesperado, subir quatro andares de um edifício onde jamais havia ido, escute: Oxalá, num momento de dor em sua vida, possa existir um cão a ganir por você, emitindo aquele doído “canhãe, canhãe”, que nos fez doer por dentro.

Depois daquele chute no fiel cãozinho, tenho certeza, o dono da bota jamais será o mesmo. Ou será?

(*) Presidente do Fórum Permanente dos Articulistas de Uberaba e Região; membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro

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