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Mitridatização

Como o provérbio nos diz que o Saber não ocupa lugar

Manoel Therezo
Publicado em 19/05/2012 às 19:26Atualizado em 19/12/2022 às 19:37
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Como o provérbio nos diz que o Saber não ocupa lugar, entendemos de passar o que se leu à frente, porque é bom saber. Mitridatização, por se estender a outros patamares, deveria ser do conhecimento geral. Especificamente, refere-se a um processo pelo qual se consegue adquirir imunidade [resistência], contra os venenos, fazendo ingestões de doses gradativamente aumentadas. Segundo o que nos informa a História da Civilização e consta na farmacopeia antiga e, certamente, em todos os dicionários, a Mitridatização foi inventada por Mitrídates, rei do Ponto Euxino [Ásia]. Daí a denominação se deriva de seu próprio nome. Por que Mitrídates se preocupou com tal procedimento? Como a corte ficava girando entre os membros da família e por vezes mal no sentido administrativo, por unanimidade do povo do Ponto Euxino, estabeleceu-se que aquele que não administrasse bem haveria de ser condenado ao suicídio à vista do público, tomando a Sicuta, [veneno] da época. Concebendo sem dúvida ser o seu destino, dia a dia, Mitrídates tomava doses aumentadas daquele veneno, forçando o organismo a se adaptar ao referido. Como previa, aconteceu.  Foi condenado.  Apresentou-se tranquilamente perante o público, tomando copadas de Sicuta, sem nada lhe acontecer. Tem-se como oportuno, não para dizer da imunidade aos venenos como assim o fez Mitrídates, mas para alertar a inconveniência da constante ingestão de medicamentos sem real necessidade e sem acompanhamento especializado. O veneno em Mitrídates deixou de surtir o seu efeito pelo fato da adaptação do organismo. Também assim ocorrerá com qualquer criatura e com qualquer medicamento tomado constantemente, porque a ele o organismo se adapta. Aquele que de há muito e por qualquer motivo toma 30 gotas de novalgina já se encontra na Mitridatização da novalgina de 30 gotas. O organismo já está adaptado àquela dosagem. Se tomar 30 gotas para o alívio de uma dor mais intensa, não terá a resposta desejada. Por vezes, o critério profissional determina uma breve descontinuidade no uso do remédio que prescreve, ou a diminuição da dose, para evitar o efeito da Mitridatização ou do Rebote. Entende-se por Rebote a necessidade de uma gota hoje, duas amanhã, três depois, até não mais se obter o efeito fácil. Por outro lado, preservando o seu real sentido, a exigência da prescrição médica para a compra de certos medicamentos tem por finalidade evitar, com plena certeza, a Mitridatização inconsciente. Em síntese, o organismo se ajusta a tudo. Também as bactérias se ajustam, ou melhor, adquirem resistência aos medicamentos. Nesta tese está inclusa a temida infecção hospitalar. De há muito, lemos uma pesquisa informando que a ingestão de tranquilizantes e de soníferos era apontada como a causa maior dos acidentes no trabalho e no trânsito no período matutino, por razões de seu efeito residual (prolongado). Pelo exposto, tem-se que toda medicação contínua leva a Mitridatização e que necessita ser acompanhada. Segundo a Farmacologia, a diferença entre o Remédio e o Veneno está na dosagem.

(*) Odontólogo; ex-professor universitário

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