ARTICULISTAS

Pai, vem me buscar

Com o maternal, primeiro e segundo graus concluídos, um jovem saindo da adolescência

João Eurípedes Sabino
Publicado em 15/07/2011 às 20:06Atualizado em 19/12/2022 às 23:21
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Com o maternal, primeiro e segundo graus concluídos, um jovem saindo da adolescência, não tinha nenhum lazer e só pensava em estudar.

Nosso filho vai ser doutor, diziam confiantes seus pais.

Vem o vestibular e aquele moço imberbe se inscreve junto a milhares numa disputadíssima universidade do país. Ali centenas lutam por uma vaga. Naquela forja de talentos formaram-se secretários de estado, ministros, governadores e destacados executivos brasileiros.

Saem os resultados e entre os primeiros aprovados está o garoto que eu vi nascer. Vibrei junto a seus familiares e ele, em festa, beliscava a si mesmo, pois parecia estar sonhando. 

Os pais – classe média – confessaram ter sido pegos de surpresa e disseram que não mereciam tanto.  Alugam um apartamento e matriculam o filho na faculdade de Engenharia Eletrônica. Doravante há que ser aumentada a renda, caso contrário o “doutor” ficará ameaçado.

Iniciam as aulas com telefonemas pra cá. Relatos interessantes, choros, demonstração de saudade, vontade da comida caseira e perguntas sobre: os irmãos, os avós, a namorada, os primos, os colegas, a antiga babá e o cãozinho da casa. Nada passava em branco ao jovem que havia saído de casa.

O pai dotado de grande sensibilidade e a mãe muito mais. Ela, no último telefonema, percebeu que a respiração do filho estava alterada.

Antes de completar um mês, aquela ausência que deveria durar 5 anos foi interrompida. No meio de uma noite soa o telefone: - Mãe, sou eu, diz do outro lado o filho soluçando. Por favor, chame o meu pai.  Alô filho, aqui é o papai, o que está lhe acontecendo? Diga! Pai... sou... eu... Pai você me perdoe, eu... desisti. Eu não quero mais ficar aqui... Vem me buscar!!

Ouvindo pouco e não entendendo nada, aquele pai pede ao filho que lhe repita tudo. Finalmente compreendeu que o “menino” cheio de incertezas havia tomado uma decisão. Tentou persuadi-lo do contrário, mas nada feito. Percebeu que ali estava uma vida à beira do desespero e respeitou o filho. Com a esposa e os outros filhos choraram juntos e viram o mundo desabar. Feito o pássaro Fênix ressurgiram depois das próprias cinzas.

Buscaram o filho com afeto. Em casa depois ele confessou que havia escolhido o curso errado. Partiu para as ciências humanas e hoje cursa o 3º ano do novo curso irradiando felicidade. A cidade grande abalou o menino do interior e o curso anterior seria a sua sepultura.

Anotei de Dr. Ângelo  Manzan, um modelo de Promotor de Justiça que passou por Uberaba, uma lição  que deu a um pai no Colégio Dr. José  Ferreira, quando o filho aprovado no vestibular abandonou a faculdade: – “O filho é a nossa obra infindável. Devemos estar com ele à vida toda, principalmente nas suas opções. Se essas opções forem boas, melhor ainda. Doutor nem todos vão ser”. E acrescentou: - “É preferível exercer o que gosta não sendo doutor, a ser doutor e exercer o que não gosta. O importante é a formação do homem”.

 

(*) presidente do Fórum Permanente dos Articulistas de Uberaba e Região; membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro

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