ARTICULISTAS

A história do leite

As associações ligadas ao setor leiteiro têm, na história do leite em nossa região

Mário Salvador
Publicado em 12/07/2011 às 19:35Atualizado em 19/12/2022 às 23:25
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As associações ligadas ao setor leiteiro têm, na história do leite em nossa região, um tema bem, digamos, saudável e delicioso para abordar para todos nós. O pouco que sei é história de consumidor e apreciador, e não, de produtor.

Logo que a minha família se mudou de Araguari para Uberaba, todos tivemos que nos adaptar aos costumes locais. Lá, naquele tempo, aquele que tinha terreno disponível na cidade criava uma cabrita. Esse animal é capaz de produzir leite para o sustento de uma família e exige pouco do criador.

Assim, em Araguari, as famílias, em geral, tinham em casa uma ou mais cabritas leiteiras. Lembro-me das muitas vezes em que tirei, diretamente no copo onde eu já colocara antes um pouco de açúcar, um leitinho da nossa Bita. Depois de o beber, feliz da vida, eu exibia um bigode branco formado por aquele leite especial...

Se lá na minha terra natal a periferia da cidade era conhecida como cabeceira, lugar do campo onde o gado pastava, por cá o nome era arrabalde. Quanto à comercialização do leite, entretanto, havia muitas semelhanças. Era do arrabalde de Uberaba que vinha o leite que tomávamos aqui, depois daquela época da cabrita leiteira lá na minha terrinha.

De início, o leite era vendido em carroças, trazido direto da fazenda, às vezes pelo próprio produtor, outras vezes pelo leiteiro, que comprava o leite para vendê-lo na cidade.

Em determinada hora do dia, o leiteiro parava a carroça, puxada por um cavalo, em pontos tradicionais nas ruas e fazia soar um sino, bem audível. Os fregueses se dirigiam, então, de suas casas até a carroça, levando qualquer recipiente onde seria despejado o leite saído da torneira de algum dos latões de metal e medido em vasilhame específico do leiteiro. E a espuma até devia ajudar o leiteiro, mas ninguém reclamava.

Não eram raros os acidentes envolvendo os latões. Por causa de alguma bacada da carroça em um dos muitos buracos da rua, esses latões viravam abruptamente, a tampa saltava e o leite ia ao chão, fazendo escorrerem com ele, como na conhecida história A Leiteira e a Bilha de Leite, todos os sonhos do leiteiro. Se ele era esperto, acudia logo, mas nunca deixava de ter algum prejuízo.

Embora proibida pela vigilância sanitária, ainda vigora, em algumas cidades do interior, essa prática da venda do leite in natura, que acaba driblando o pagamento de impostos.

O tempo passou e houve uma mudança significativa na distribuição do leite na cidade. Ele passou a ser vendido em vasilhames de vidro de um litro.       Os primeiros litros possuíam tampa de papelão, mais tarde substituída por tampa aluminizada, que protegia melhor o produto.

Muitas famílias recebiam esse leite engarrafado e também o pão, que era depositado bem cedinho em sacos de tecido, tudo do lado de fora da porta de suas casas que dava para a rua. E a conta era acertada periodicamente na padaria. Curioso é que eram raros os problemas de roubo desses produtos na porta das casas. Imaginem!

Depois o leite passou a ser vendido em bares, armazéns, vendas e mercearias. Os fregueses compravam apenas o leite propriamente dito, pois o vasilhame era retornável. Mais tarde chegou ao mercado o leite em saquinhos plásticos, exatamente como o temos ainda hoje. Um pouco mais e as indústrias do ramo puseram nas prateleiras o leite em embalagem longa vida.

Contamos, como consumidores, uma breve história da comercialização desse produto de grande importância para a humanidade. E nos lembramos de que, lá no comecinho de tudo, está o abnegado produtor, enfrentando inúmeros problemas, mas sempre firme na produção do nosso leite de cada dia.

E todo este conteúdo renderia uma boa história a ser contada agora pelas associações ligadas ao setor leiteir o processo de industrialização do leite, a arregimentação dos produtores em cooperativa, fazendo valer o velho ditado popular de que “a união faz a força”, o processo de modernização nas instalações industriais, as novidades de marketing nas embalagens chamativas, bem como os percalços ao longo da história e “a volta por cima”...

O preço irrisório do leite produzido a duras penas é, muitas vezes, surpreendentemente menor que o da água. Conhecendo essa história já vivida e que falta apenas ser escrita, surge a esperança de que as autoridades valorizem, enfim, o trabalho do produtor leiteiro.

(*) Membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro

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