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Terrorismo: um bolo em camadas

À primeira vista, quem olha para este bolo de camadas superpostas e se limita à percepção de sua superfície

Ilcéa Borba Marquez
Publicado em 03/03/2011 às 22:17Atualizado em 20/12/2022 às 01:22
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À primeira vista, quem olha para este bolo de camadas superpostas e se limita à percepção de sua superfície, não vê mais que esta cobertura glamourosa de heroísmos trágicos, que se manifestam em atos de desespero e que custam o preço da vida.

Abaixo desta primeira, surge a segunda camada do bolo, feita de perguntas nascidas da perplexidade, às quais podem ser dadas respostas políticas de todos os matizes, que terminam por criar um circulo vicios a opressão belicista gera o terrorismo e o terrorismo gera a opressão belicista. Causa e efeito se retro-alimentam.

Situemos-nos na terceira camada do bol o problema religioso e suas vertentes míticas. O ato terrorista, que implica no sacrifício da própria vida, é tido pelos religiosos de certos credos islâmicos como um exercício sagrado que garantiria ao seu executor um passaporte seguro para o céu, onde ele gozaria das graças e glórias do Deus de seu povo. Antes mesmo de praticado e, principalmente depois, a comunidade terrena em que ele vive cerca o terrorista e seus familiares de aplausos, admiração, homenagens e compensações financeiras. No conflito atual do Oriente Médio esta ascensão aos céus é um dos pontos de maior significação. Ali, 3 religiões lutam pela posse do território sagrado de seus templos ou das ruínas deles, e dos túmulos de seus antepassados, que teriam tido, dizem os mitos, um contato de primeiro ou de segundo grau com o respectivo Deus de cada religião. Estas minúsculas regiões geográficas não podem deixar de lhes pertencer porque se tornaram, no imaginário mítico de cada povo, o portão sagrado para ascender aos céus pelo caminho das orações, das privações, das peregrinações, do jejum, do sacrifício.

Vamos então à quarta camada do bolo, que a psicanálise explica.Terroristas são pessoas aterrorizadas para as quais é difícil suportar o terror do desamparo inerente à vida. O terror que eles difundem e disseminam é o terror que eles não suportam carregar consigo, enquanto vivos. Por outro lado também não suportam a confissão desta debilidade ou desta covardia, nem a si mesmos. Oferecem-se para a prática de um gesto heróico que lhes vai permitir livrar-se da vida insuportável e da vergonha de confessá-lo, ainda que fosse só para pedir ajuda. É claro que estas coisas não são conscientes. O sacrifício aparentemente heróico de um terrorista muitas vezes não passa de uma depressão que está em busca de uma causa "nobre", que sirva de justificativa a um suicídio longamente sonhado.

(*) psicóloga e psicanalista

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