ARTICULISTAS

Amava os desafios

João Eurípedes Sabino
Publicado em 31/03/2022 às 19:20Atualizado em 18/12/2022 às 23:15
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Conhecido pecuarista de Uberaba, no início dos anos 50, precisava deslocar por terra um rebanho composto por 80 vacas nelore. O local da partida era a chácara de D. Candoca (próximo de onde é hoje o Jockey Park e extensão). A chegada seria nas redondezas do famoso Chuá. Não é segredo que a raça nelore sempre marcou pela sua natureza arredia. Para lidar com ela, há que se usar certa perícia, senão as investidas podem ocorrer.

Peões foram convidados. Uns colocavam dificuldades, outros pediam muito dinheiro para a empreitada, além daqueles que confessavam de cara limpa ter medo das 80 vacas. Surge um peão pronto para o desafio e diz: – “Eu levo as vacas e não preciso de companheiros. Vou com Deus, minha mula Rainha e a cadela Fera. Em quatro horas de marcha estarei no curral, entregando a encomenda. Cobro “X” e 50% é adiantado. Na entrega das matrizes recebo o restante”. Aí vem o pulo do gato, reparem.

Pecuarista desconfiado combinou o deslocamento do rebanho e adiantou a metade da gaita. Seu espanto foi grande quando o peão lhe disse que sairia com o gado à meia-noite. Montado em sua besta ruana, colocou as ferozes rezes no corredor. Na dianteira estava a cadela Fera, uma policial peluda e de respeitável porte.

Ao entrar na estrada (hoje BR-262), não demorou muito para uma vaca se desgarrar do grupo e como que incitar as outras a fazer o mesmo. O trabalho do peão, com certeza, iria para os ares não fosse sua voz de comando que ecoou na noite escura: – “Pega Fera!”.

Decidida, Fera partiu e travou os dentes no focinho da rês rebelada. A bela zebuína, apesar da força, ficou imobilizada e as 79 diminuíram a marcha até parar. Minutos depois: – “Solta Fera!”, bradou o peão e as ventas da vaca foram liberadas.

Fera na guia, vacada no meio e o peão na retaguarda. Cessaram as ameaças de debandada e o pacífico rebanho chegou ileso ao seu destino, na hora marcada. Pecuarista satisfeito pagou o peão e lhe deu uma polpuda gorjeta. Essa é uma das histórias do homem que nasceu sem medo e amava os desafios: meu pai, Genésio Sabino.

 

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