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Com a palavra o Supremo Tribunal Federal

Mônica Cecílio Rodrigues
Publicado em 16/06/2019 às 21:26Atualizado em 17/12/2022 às 21:43
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Em 2010, a Emenda Constitucional nº. 66 reconheceu que o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio.

Os doutrinadores de início se dividiram entre argumentos para interpretar esta nova norma de direito de família. Haviam aqueles que defendiam o fim do lapso temporal para se pleitear, quer seja administrativa ou judicialmente, o divórcio consensual e bem como advogavam o fim da separação judicial. Já o outro lado, mais apegado a literalidade da lei, não admitia que a separação havia acabado e também não aceitava a possibilidade de se divorciar consensualmente sem o prazo legal exigido pela lei civil.

As divergências não duraram muito quando os Tribunais pondo fim a questão convertiam o pedido de separação em divórcio.

Todavia, como em nosso país não raro as legislações se esbaram, não com o sentido técnico de revogar uma lei, mas em um significado de desconhecer o que já existe na lei (veja o exemplo do procedimento de interdição com o Estatuto de Inclusão Social), o que acaba por expor o cidadão a confusão legislativa, onde o doutrinador em primeiro lugar tenta interpretar a lei para resolver a mixórdia, finalizando com o enfrentamento das questões pelo Poder Judiciário, onde por muitas vezes amaina a questão.

S.M.J., o problema mesmo é de semântica. Pois a lei não pode ser feita sem que seja pensado em um sistema, uma completude.

Com certeza, um estudo sobre o significado das palavras, da intepretação quando componente de uma sentença, não deixando de vislumbrar a existência de um sistema, talvez não ocorreria tais incoerências nas leis.

Pois bem, com a entrada em vigor da nova lei processual, onde se dita os ritos e procedimentos para o cidadão socorrer ao Poder Judiciário na busca de seu direito, ressuscitou a separação. Vez que foi expressamente nominada como forma de dissolução da sociedade conjugal.

E neste hiato temporal, da Emenda Constitucional de 2010 e a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015, os Tribunais chancelavam o fim do prazo para o divórcio consensual e mais, transformavam o pedido de separação em divórcio sem pormenorizar.

Haja vista que a redação anterior a Emenda determinava que o casamento podia ser dissolvido pelo divórcio consensual somente após prévia separação judicial por mais de um ano ou se separados de fato por mais de dois anos.

Agora, em razão de um Recurso aviado ao Supremo Tribunal Federal a questão volta com todo vapor ao Judiciário.

E afinal é mesmo a Corte Constitucional que irá resolver o que, não só os doutrinadores, com esforço hercúleo fizeram, mas também os Tribunais quando interpretaram o fim do lapso temporal e o falecimento da separação.

Caberá ao Supremo decidir, após reconhecer a repercussão geral da matéria constitucional alegada no recurso, se ainda somos um sistema binário. Onde coexistiria a separação e o divórcio, sendo a separação, judicial ou de fato, condição para o divórcio consensual. Ou a autonomia do divórcio para a dissolução conjugal como um direito, sem exigência de qualquer lapso temporal ou outro requisito.

A argumentação dispendida no inconformismo é de que a regra trazida pela Emenda Constitucional não tem aplicação imediata; portanto, o divórcio estaria regulamentado pela legislação civil, o que implicaria na exigência do lapso temporal de dois anos se fosse separação de fato; ou precedido de separação judicial.

Não resta dúvida que esta decisão afetará ações semelhantes, razão do reconhecimento de repercussão geral.

O pensamento que se desperta é sobre a cautela que a Corte Constitucional deve ter ao proferir esta decisão, haja vista que todo este enredo confuso é apenas uma característica de que as leis em nosso país “não conversam entre si”!!!

Mônica Cecílio Rodrigues é advogada, doutora em processo civil pela PUC-SP e professora universitária. E-mail: [email protected]

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