ARTICULISTAS

As lições desprezadas do século XX

De nada adiantam os projetos para o próximo ano a partir das análises do anterior

Ilcéa Borba Marquez
Publicado em 03/01/2018 às 19:05Atualizado em 16/12/2022 às 07:38
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De nada adiantam os projetos para o próximo ano a partir das análises do anterior; de nada adiantam os rituais de renovação cumpridos corretamente após qualquer período de tempo; de nada adiantam as tentativas de controle do tempo que nos escapa; de nada adiantam as ideias de renovação inerentes ao costume de contagem e recomeço embutidos na crença de um tempo circular que sempre retorna ao começo se as condutas não mudam, se o medo do novo supera qualquer projeto ou se as lições anteriores são cautelosamente guardadas a “sete chaves” numa gaveta bem trancada. Precisamos criar coragem para aprender com os erros anteriores pessoais ou de outros.

O século passado, conhecido como o Século das Guerras, mostra claramente os fatores responsáveis por tanta morte e destruição e surpreendem-nos sobremaneira que as lições não foram capazes de provocar mudanças significativas no mundo todo. Lendo o primeiro volume da trilogia de Ken Follett sobre o século XX - Queda de Gigantes - fiquei impressionada com o fraco desempenho da grande Rússia na 1ª Guerra Mundial, mesmo tendo um exército de 6 milhões de homens e muita riqueza de consumos. Na medida em que minha leitura avançava, ia aos poucos compreendendo os motivos do desastre. A Rússia mostrou total despreparo para enfrentar o conflit não tinha linhas abertas de ferrovia capaz de colocar seus homens nas linhas de combate; os recrutas tinham que percorrer longas distâncias a pé, sem nenhum comboio de alimentos ou mesmo água eficiente. Para matar a sede, eles aprenderam a beber e encher os cantis nos riachos que atravessavam, ou aproveitar qualquer alimento que encontrassem. Não podiam cozinhar e durante todo o tempo em que percorriam a pé, sem descanso, grandes distâncias tinham apenas bolachas duras e secas como alimento. À noite dormiam ao relento, debaixo de árvores sem barracas ou colchões. Iniciaram a guerra atropeladamente confiando apenas no número elevado de “vidas humanas” que podiam desperdiçar. Além da pressa de entrar na luta, havia, principalmente – muita corrupçã os generais que recebiam as verbas para estruturar o exército desviavam o dinheiro para os próprios bolsos vendendo as lonas de barracas, trocando armamentos e munições indicadas por outras ineficáveis, de custo bem menor. As aberrações estratégicas não se restringiam à Rússia – o uniforme de batalha dos franceses era calça de veludo vermelho e casaco azul, avistados ao longe, e boné de pano que não protegia as cabeças dos soldados; os capacetes pontudos de metal dos prussianos que funcionavam como para-raios, e, ainda em desacordo com as estações... Desastre total!

(*) Psicóloga e psicanalista [email protected]

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