Pânico geral instalado

Chico Buarque de Holanda, na década de sessenta do século passado, deitou e rolou ao ironizar o governo militar que havia se instalado no Brasil em 1964 com sua marcha “A banda”. Não deixou por menos e tempos depois lascou cantando em “Meu caro amigo”: “Mas eu só quero é te dizer que a coisa aqui tá preta...”. Parecia-nos que ele tinha certa razão. Hoje Chico se encastelou e, apesar do caos em que estamos vivendo, os seus olhos verdes parecem não ver mais nada. Ei, Chico! Cadê a sua criatividade?

Uberaba nunca será a mesma depois do dia 06/11/2017, precisamente após as três horas da madrugada. Bandidos armados com fuzis e metralhadora ponto50 fizeram a festa na cidade, clareando o céu com seus fogos mortais e mudando a acústica do tempo com rajadas contínuas e intermitentes. Meu cachorro Kiko e a cadelinha Alegria, que anunciam de traques a trovões, sequer bocejaram para avisar que havia tiros no ar.

Tatá, tátátátátátá, tátá! Estampidos acordaram nossa gente. Enquanto isso, bandidos em pontos estratégicos impediam o ir vir dos cidadãos, inclusive e, principalmente, o da polícia. Quartel militar sitiado, ruas trancadas com correntes, carros incendiados e explosão do QG de uma empresa transportadora de valores. O pânico geral foi instalado! Redes sociais disseminaram os acontecimentos e, em tempo real, o mundo ficou sabendo. Se quisessem aprontar mais, era só querer.

Tenho comigo que em tempo algum da sua história, nem na Revolução de 1930, Uberaba ouviu tantos tiros por minuto. Consta que para amedrontar os paulistas, engenhou-se uma tal matraca com manivela que, ao girar o seu eixo, emitia som irreal de metralhadora atirando. De longe parecia mesmo. Acrescento que, seguramente nunca vimos tantos facínoras armados por metro quadrado. É de pasmar ao mais ingênuo, o fato de nenhuma inteligência ter detectado o início da movimentação suspeita de estranhos. Se a jovem Kelly Cristina Cadamuro, assassinada entre Campina Verde e Itapagipe no dia 04/11 /2017, teve seu crime desvendado em poucas horas, é certo que o mega-assalto de Uberaba será esclarecido em tempo recorde. Ou não?

Aí provamos a quantas anda a nossa fragilidade, física e institucional. Mandaram-nos deitar no chão para que os bandidos pudessem agir. Veio-me à mente o que passam as comunidades no Rio de Janeiro quando convivem com essa guerra todos os dias! Lá não basta deitar porque as balas perdidas acham os inocentes como acharam o menino Vítor Gabriel Leite, 3. Céu da Síria, sem exagero, é o que moradores nas proximidades da explosão, traumatizados, mentalizam e nós que ouvimos tudo à distância, ficamos a imaginar: haverá a reedição de tudo?

Um simples cartão social ou recibo achado na rua, indicando ser de loja de ferragens, levou a polícia aos assaltantes. As correntes usadas para trancar ruas foram adquiridas em Araguari. Constatada essa relação, um grupo caiu em Caldas Novas (GO).

Em temp sou a favor da atuação da polícia, que não revidou para evitar a morte de inocentes.