ARTICULISTAS

O rico não vive sem o pobre

Eu aguardava qualquer coisa no guichê de uma instituição administrativa...

Padre Prata
Publicado em 26/02/2017 às 16:29Atualizado em 16/12/2022 às 14:57
Compartilhar

Eu aguardava qualquer coisa no guichê de uma instituição administrativa. Ao meu lado, pacientemente, um senhor também esperava. Causava um pouco de estranheza, estava sujo, mal barbeado, cabelos desalinhados e suava por todos os poros. A mocinha que nos servia (funcionária pública), não se sabia por quê, mostrava visível mau humor. Ao se deparar com aquele senhor em sua frente, torceu o nariz e comentou para seu colega ao lad “O pior é o mau cheiro”. A resposta do rapaz foi de grande sabedoria: “Esse cara é um daqueles que se levantam às três horas da madrugada para tirar o leite que você bebe em seu café da manhã. É gente boa”.

Todos nós temos muita facilidade para julgar os outros pelas aparências. Nós nos esquecemos com muita facilidade de que dependemos uns dos outros. Sozinhos não sobreviveríamos. Paulo, o Apóstolo, numa de suas cartas, afirma que em nosso corpo os órgãos que parecem mais frágeis são os mais necessários. Assim no corpo social. Precisamos mais dos pobres do que eles de nós. O que vou dizer parece um pouco fantasioso, exagerado ou injusto.

Mas, pensando bem, tem alguma coisa de verdade. Se houvesse uma cidade só de pobres, eles sobreviveriam. Eles fariam todos esses serviços de infraestrutura social. Entre eles estão os pedreiros, os cozinheiros, os lixeiros, os lavradores, os padeiros, as lavadeiras, as arrumadeiras, os motoristas, as babás, enfim, toda essa gente que faz os serviços mais humildes. Para eles, não seria tão difícil uma sobrevivência. Viveriam como pobres, com dificuldades, mas a solidariedade deles cobriria as deficiências.

Agora, pense numa sociedade só de ricos. Quem pegaria o lixo deles? Quem lavaria suas roupas, limparia suas casas, arrumaria seus jardins? Quem faria o pão para eles? Quem consertaria seus carros, ensinaria seus filhos? Quem cortaria seus cabelos? Eles não sobreviveriam sem os pobres.

O que estou escrevendo talvez seja imaginário, fantasioso. Até ingênuo. Mas, não é verdade que as classes A e B não viveriam sem a classe C? Não precisamos mais deles que eles de nós? Então, por que essa mania que nós temos de olhar o pobre de cima para baixo? Por que ficar achando que sem nós, da classe média e da classe rica, eles não sobreviveriam?

Ser solidário não é ter pena do mais pobre, do que sofre, mas tomar consciência de que necessitamos uns dos outros. “Nenhum homem é um ilha” é o título de um livro de Thomas Merton.

Certa vez, Jesus nos alertou: “Vocês sempre terão pobres entre vocês”. Não estaria Ele sugerindo que eles são necessários para a sobrevivência de todos nós?

Assuntos Relacionados
Compartilhar
Logotipo JM Magazine
Logotipo JM Online
Logotipo JM Online
Logotipo JM Rádio
Logotipo Editoria & Gráfica Vitória
JM Online© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por