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Tudo muda porque o tempo passa ou o tempo passa porque tudo muda?

Eliane Brum em um dos artigos para sua antiga coluna na Época escreveu que viajar é se desconhecer...

Julia Castello Goulart
Publicado em 12/01/2017 às 20:25Atualizado em 16/12/2022 às 15:46
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Eliane Brum em um dos artigos para sua antiga coluna na “Época” escreveu que "viajar é se desconhecer". Até o início deste ano, não tinha parado para pensar nessa pequena grande verdade. E não, não foi porque viajei para fora do país, para a praia, para as montanhas... Foi porque eu viajei para a minha cidade natal, depois de passar um ano fora de casa. Voltar para o lugar onde um dia foi seu cotidiano, só que agora como de passagem, sabendo que um dia você vai embora, muda tudo. Era a primeira vez que eu VOLTAVA para a minha casa. Porque querendo ou não, eu sempre estive nela, até me mudar.

Nunca pensei que eu voltaria para a minha casa, que eu conheço de olhos fechados, e ela estaria tão diferente. As pessoas que moram nela, que chamo de família, estavam diferentes. Mais magras, mais gordas, mais barulhentas, mais silenciosas, mais experientes e mais velhas, porque até então parecia que o tempo havia passado só para mim. Esperava voltar e encontrar a rede na varanda com o rasgo que eu fiz sem querer, a pia que não cessa de pingar, as bonecas em cima da minha cama, os “toddynhos” na despensa, a piscina vazia, os meus alertas com horário de médico, dentista e a tabela periódica no quadro de avisos, tudo exatamente como me lembrava desde a última vez que eu fui embora.

Pela primeira vez eu vi uma casa e as pessoas tão familiares para mim, de uma forma tão diferente, que pensei que elas é que tinham mudado demais. No dia em que entrei na piscina cheia, percebi que não me lembrava da última vez que eu havia entrado nela. E foi na minha tentativa desesperada de lembrar de momentos nostálgicos da minha infância, que não percebi que desde o momento em que eu havia voltado, já estava criando novas memórias. Talvez demorei um pouco para perceber que tudo tinha mudado, nem que sejam as mesmas coisas, elas estavam mais velhas. E o mais importante: eu havia mudado. Na tentativa de querer que tudo permanecesse como estava, para lembrar as coisas que eu havia feito, estava evitando criar novos momentos.

Foi preciso que eu voltasse para a minha casa, nestas férias que nunca esperei que nada acontecesse, para perceber como eu tinha mudado e como temos medo da mudança. Precisei voltar para um lugar que sempre havia sido comum, para me desconhecer, para olhar tudo que parecia tão familiar com outros olhos. E perceber que tudo muda e nós mudamos, ainda bem, porque só assim podemos ter novas memórias nos mesmos lugares, com as mesmas pessoas. Basta se desapegar "do que tem que ser" para "o que pode ser".

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