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Abandono afetivo paterno

Há algum tempo os Tribunais brasileiros vêm se debruçando sobre a possibilidade...

Miralda Dias Dourado de Lavor
Publicado em 02/10/2016 às 11:53Atualizado em 16/12/2022 às 17:10
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Há algum tempo os Tribunais brasileiros vêm se debruçando sobre a possibilidade de um filho buscar na Justiça uma indenização pelos danos morais decorrentes do abandono afetivo paterno. Algumas indenizações foram concedidas, outras negadas.

O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1.159.242 de Abril de 2012,  conferiu parâmetros mais claros para o conflito de direitos fundamentais existente entre a liberdade do genitor e a solidariedade familiar. Estabeleceu-se no referido julgado que, embora não se possa impor o amor aos filhos, existe um dever jurídico que decorre da liberdade das pessoas de gerar ou adotar filhos. O pai que se omite no dever de cuidado está sim infringindo normas, abrindo-se a possibilidade de responsabilização civil, havendo prova do dano decorrente da conduta omissiva.

O “dever de cuidado” abrange não só o indispensável para a sobrevivência, que pode ser alcançado pelo pagamento dos alimentos. Mais que isso, alcança a criação, educação e companhia dos filhos, elementos que não se materializam, mas, que são imprescindíveis para proteção física e psicológica dos seres humanos, os quais advêm de uma presença constante que direciona, educa, impõe limites e dá segurança.

Estudos profundos sobre as consequências da ausência paterna revelam que, além de toda sorte de sentimentos negativos que os filhos experimentam (rejeição, tristeza, abandono, medo, etc.), diversas situações podem se abater sobre os mesmos, tais como, comportamentos delinquentes, embriaguez, uso de drogas e atividade sexual precoce.

A partir disso, pode-se dizer que abandono afetivo não acarreta prejuízos apenas ao filho, mas, traz consequências graves para a sociedade como um todo. Daí porque a omissão do dever de cuidado é questão importante e que deve ser objeto de trabalho sério de instituições responsáveis pela defesa dos interesses sociais e individuais indisponíveis, como o Ministério Público.

Antes de se pensar em indenizações, imprescindível agir de forma preventiva, buscando sensibilizar pais ausentes, especialmente na primeira infância de seus filhos, conscientizando-os de sua obrigação legal de cuidar e orientando-os de que cuidado requer presença, atenção e convivência. Para isso, está sendo elaborado pela Promotoria de Justiça de Família, em Uberaba, o Projeto Prevenção ao Abandono Afetivo, cujos detalhes serão divulgados em breve.

De fato, não se pode obrigar ninguém a amar. Mas, a omissão ao dever de cuidado, contraria a lei. Uma vez imposta a convivência e cuidados diários com a criação e educação, surpreendentemente pode surgir ou se construir o amor ao próprio filho, como ocorre nas adoções.

Inaceitável é ignorar o direito fundamental à convivência familiar (artigo 227 da Constituição Federal).

(*) Promotora de Justiça e Membro da Diretoria do IBDFAM – Núcleo de Uberaba

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