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Lugar atual das crianças nas famílias

Estar com os pais em situações até mesmo de lazer também proporcionam reflexões...

Ilcéa Borba Marquez
Publicado em 25/05/2016 às 19:41Atualizado em 16/12/2022 às 02:55
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Estar com os pais em situações até mesmo de lazer também proporcionam reflexões significativas e esclarecedoras. Assim foi um encontro de final de semana com os pais de duas crianças sendo uma de oito anos e outra, de 5. Num certo momento a mãe revelou uma dificuldade que enfrenta com as duas filhas que, segundo ela, são totalmente diferentes uma da outra. Essa diferença se expressa e se consolida nos momentos em que há algum convite dos pais para uma atividade como, por exemplo, o almoço fora de casa no final de semana. Quando a primeira aceita o programa e manifesta desejo de ir a outra, imediatamente, exprime o oposto, um solene – Eu não quero ir! A tarefa de fazê-la mudar de opinião é bastante difícil e a família toda perde muito tempo quando não acaba desistindo daquele programa.

Duas características marcantes tornam-se evidentes pela simples revelação da cena. A primeira poderia ser definida pela oposição identificatória e a segunda, por um ato de vontade ou um querer. Em relação à primeira, podemos dizer que um processo de rivalidade fraterna, que pode proporcionar identidades próprias e construção de uma subjetividade única, está em curso, já a segunda poderíamos usar de algumas informações sobre o desenvolvimento infantil à guisa de subsídios de discussão.

De acordo com Schopenhauer, cada idade se caracteriza por uma forma particular de ser e estar no mundo em consonância com as habilidades e capacidades já adquiridas. Schopenhauer considera os anos da infância como poéticos em relação à memória: “O intelecto... procura nutrir-se sem cessar de toda essa existência ainda nova, na qual tudo, absolutamente tudo é revestido com o atrativo da novidade. Eis a razão de a nossa infância ser uma poesia ininterrupta, pois a essência da poesia, como em toda arte, consiste na apreensão, em cada coisa isolada, da ideia platônica, isto é, do que é essencial e comum a toda a espécie, sendo assim, cada objeto aparece como o representante desta, e um único caso vale por mil.”

Quando crianças, nós nos comportamos como puros seres cognoscentes, e não volitivos. Entre as razões desta realidade está o fato de que na infância temos poucas relações interpessoais e poucas necessidades, portanto pouca estimulação para a vontade – esta está muito longe de aparecer em toda sua força. Empenhamo-nos para conhecer e não para o querer. Voltando à cena introdutória podemos afirmar que as crianças em questão não expressam um ato de vontade, mas simplesmente uma disputa pelo poder no seio da pequena família. Querer significa preencher uma falta, buscar satisfação a um anseio por algo ou alguma coisa que possa preencher o vazio da falta. Na verdade, a luta pelo poder está nas duas situações reforçando ainda mais esta disputa rival e totalizante.

(*) psicóloga e psicanalista

ilceaborba @gmail.com

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