ARTICULISTAS

Acabou morrendo

Já faz tempo, houve uma briga aqui em Uberaba entre um gramático e um bispo...

Padre Prata
Publicado em 24/04/2016 às 12:29Atualizado em 16/12/2022 às 19:11
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Já faz tempo, houve uma briga aqui em Uberaba entre um gramático e um bispo. Discutiram durante vários meses e vários quilômetros de colunas nos jornais, se a gramática tinha ou não tinha lógica. Parece-me que não houve vencedor. Até hoje não sei por que se gastou tanto tempo e tanta tinta com assunto de tão alta especulação. Sobretudo de tão profunda repercussão social...

Não estou muito interessado em saber se há ou não lógica na gramática. O que sei é que há coisas estranhas. Sem sentido. Veja, por exemplo, o verbo suicidar. Vem do latim, de “occidere sui”, que se traduz por “matar-se”. Pois bem, aí então, vem o português dizendo assim: “eu me suicido”, o que é o mesmo que dizer “eu me mato-se”. Tem lógica?  E assim muitas coisas mais.

Aos doze anos, nos meus tempos de Diocesano, aprendi com o Irmão Hilário, que existem verbos chamados auxiliares. Aprendi ainda que o conjunto formado por um auxiliar com outro verbo chama-se locução verbal. Não sei se isso já mudou ou não. Naquele tempo era assim.  Aprendi também com aquele mestre que os auxiliares eram quatr ser, estar, ter e haver. Nunca mais me esqueci. O ensino vinha acompanhado de “cascudos”, linhas para decorar e outros processos educativos muito usados na época. Naquele sistema, aprendia-se querendo ou não.

Como tudo está mudando, não sei se a gramática mudou muito. Lembro-me do Irmão Hilário acrescentando que havia outros verbos que, às vezes, podiam funcionar como auxiliares e citava os verbos ir, vir e andar. Mas, estas distinções não vêm ao caso.

Hoje, por nossa própria conta e risco, acrescentamos outro verbo auxiliar à nossa gramática. É o verbo “acabar”.  Este verbo serve para tudo. Basta que você leia com atenção os jornais. É empregado em qualquer circunstância, positiva ou negativa. Compõe as proposições mais disparatadas. Você já prestou atenção no fato de que todo ferido grave “acaba morrendo antes de dar entrada no hospital”?  Outros exemplos: a criança acabou nascendo sem defeito, ele acabou escapando da morte, ele acabou vivendo, ele acabou morrendo, acabou caindo no sono, acabou perdendo a paciência, acabou se vingando, acabou perdoando, acabou cedendo e assim poderia citar centenas de empregos com o verbo acabar. É um acabar que não acaba mais.

Depois de tudo, penso que acabei com sua paciência, mas, por favor, não acabe comigo. Sei que você vai acabar me perdoando ou então me pedindo para acabar logo com essa lengalenga.

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