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Desafiantes conquistas

Não se sinta no direito a nada que você não tenha lutado ou conseguido com o seu suor

Ilcéa Borba Marquez
Publicado em 17/02/2016 às 19:39Atualizado em 16/12/2022 às 20:04
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 Desafiantes conquistas

“Não se sinta no direito a nada que você não tenha lutado ou conseguido com o seu suor.” Edelman M. As relações de dependência mostram-se pesadas e difíceis de serem vividas. Talvez porque depender signifique submeter-se ao poder do outro, em outras palavras, porque depender detém em si mesmo a submissão e a sujeição ao poder do outro. Apesar de ser, inicialmente, totalmente dependente de um outro que o alimente, proteja e cuide, logo cedo o homem rejeita esta dependência que o pacifica no sentido de estar passivo a alguém maior, mais forte e inteiro, onde podemos encontrar “estar à mercê” ou estar fragilizado diante de um oponente que seja também um opositor. Este é um risco à sobrevivência humana e por isso mesmo faça um apelo tão forte às forças arcaicas que se responsabilizam pela preservação da própria vida.

As histórias individuais e humanas estão pontuadas por exemplos que uma simples reflexão traz à tona. As grandes catástrofes geológicas ou políticas sociais já vividas preconizam os perigos de uma experiência fragilizante ou apenas momentaneamente fragilizante como os períodos que se sucederam às grandes guerras, quando compreendemos que os outros existem não como objetos possíveis de nossa satisfação, mas como sujeitos de seus desejos, em outras palavras, como tão suscetíveis de nos rejeitar quanto de nos amar, de manifestarem vontades contraditórias às nossas, de representarem perigos permanentes não apenas para nosso narcisismo, como também para nossa simples sobrevivência, e de serem, para nós, apesar de tudo isso, tão indispensáveis quanto o ar que respiramos.

O irmão, o semelhante, é um adversário em potencial às vezes até mesmo um inimigo cruel, mesmo porque nós mesmos somos seres de desconhecimentos, de lacunas e de transbordamentos; mesmo possuindo um corpo que constitui uma membrana sólida de proteção contra os outros, que nos isola e nos identifica, sabemos apesar disso, que este corpo está repleto de sinais de outrem: palavras dos primeiros educadores, destrutivas ou carinhosas, mas igualmente traços de carinho e traços de golpes, e ainda objetos introjetados, objetos a expulsar, significando que este corpo não está e não pode estar totalmente desligado do corpo da mãe, que ele porta dela os estigmas como porta em si a marca paterna: a castração simbólica inscrita no Édipo. O grito à autonomia faz parte da ilusão de liberdade e individualidade, consequência da vitória sofrida sobre cada pedaço minúsculo de conquista apessoada que fortalece verdadeiramente. Daí que receber simplesmente um bem ou um presente destrói a própria possibilidade de vir-a-ser.

Ilcea Borba Marquez – psicóloga e psicanalista

e-mail – [email protected]

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