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O caso da alma

Parecia indecifrável. As provas materiais eram pouco consistentes, soltas, não se encaixavam

Luiz Cláudio dos Reis Campos
Publicado em 14/04/2015 às 20:34Atualizado em 17/12/2022 às 00:36
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Parecia indecifrável. As provas materiais eram pouco consistentes, soltas, não se encaixavam no mosaico que certamente o caso requeria. Não se tratava de serial killer, nem uma cruel vingança, nem uma morte misteriosa em um vagão de trem. Nem era mesmo um crime com um corpo. Não era um nome sem corpo e nem um corpo sem nome. Bom, se não há corpo, se não há nome, como dar razão a esse enigma. Os competentes detetives já temiam ser devorados pela esfinge que se tornou aquela incógnita que sobrava na equação que não permitia solução. O tempo corria contra a resolução e a favor do mistério. O tempo tem ao mesmo tempo quem se beneficia e quem se prejudica com a sua celeridade ou demora. Eis que, súbito, surge uma personagem que poderia dar novo rumo ao caminho até então percorrido. Era alguém que trazia um bilhete dizendo que resolveu aparecer porque quando se perde a alma, ninguém desvenda e nem sabe de seu paradeiro. Sobre a mesa, diante de atônitos detetives, ela, desfigurada, deixou o bilhete e desapareceu. Com a leitura do que escrevera o caso foi encerrado. E daquele dia em diante surgiram os caçadores de alma. Eis o que continha o bilhete: “Estou comunicando o desaparecimento de minha alma. Quem souber de algum indício, ou evidência de seu paradeiro favor entrar em contato. Reparem bem para não confundi-la com alguma gêmea, visto que alma não tem gênero. Estou desalmado e isto me incomoda muito. Minha alma é calma, também tem desassossego, sabe guardar segredo, tem um pouco de medo de tudo um pouco, é desconfiada, às vezes dissimulada, faz de conta que não quer nada, não topa qualquer parada, sozinha fica angustiada. Minha alma perambula muito, mas sempre volta pro seu canto. Desta vez creio que foi longe demais e perdeu-se, não encontra o caminho de volta. Vou publicar a seguinte mensagem em diários, revistas, redes sociais e rádio, quem sabe ela consiga neste apelo achar de novo sua morada. Alma minha que partiste deixou-me triste e sem vida, desalmado. Saiba que o seu lugar está guardado, pois alma que vagueia não vai a lugar nenhum. Alma minha você não é de mais ninguém. Espero reencontrá-la antes que morto para a vida, amém. Um conselho de quem padece sem alma: não despreze e nem menospreze a sua, trate-a como a essência que alimenta a sua vida. Com a alma não pode haver despedida, ela é sempre o nosso ponto de partida. Viver sem alma é viver sem ser”.

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