ARTICULISTAS

Passaram pelo mundo

Seríamos felizes se, depois de nossa partida, nossos amigos se lembrassem de nós

Padre Prata
Publicado em 22/03/2015 às 11:58Atualizado em 17/12/2022 às 00:54
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Seríamos felizes se, depois de nossa partida, nossos amigos se lembrassem de nós e dissessem: passou pelo mundo fazendo o bem. Depois da morte, todos nós nos tornamos bons.  Frase que não diz nada, apenas um aliviar de consciência por tudo aquilo que falaram mal de nós.

Mas, o Pedrinho era bom de verdade. Pedro Rocha. Morava lá pelos lados das Mercês, na rua Episcopal. Gostava de botar inveja nos outros quando afirmava que o Bispo era vizinho dele. Não sei se isso trazia algum lucro para ele, apenas achava que estava valorizando o bispo. Era baixinho, franzino, sempre sorridente, católico verdadeiro, de missa e comunhão. Ainda em vida, todos o estimavam com um homem bom.

Depois de sua aposentadoria, Pedrinho teve que correr atrás do prejuízo. Pagava imposto de carro, levava para emplacar, pagava as multas e outros serviços. Fazia tudo a pé, com sol ou chuva. Acontece que era econômico e tinha casa própria. Com o tempo, poupou alguns caraminguás que lhe permitiram comprar um fusca. Era um carrinho usado e barulhento, mas era dele, resultado de muito suor e calo nos pés. Guiava a vinte por hora, sempre devagar. Por isso foi que ninguém acreditou no que aconteceu.

Mas, todo santo tem também defeitos, o Pedrinho tinha o seu. Era distraído. Foi justamente esta a razão daquela batida, logo ali na Praça dos Correios. Não acertou nenhum poste, nenhuma árvore, nem sequer uma carroça. Só tinha avançado o sinal e arrebentara  a porta dianteira de um Cadillac azul. Lá de dentro desceu um ferrabrás de um metro e oitenta e pegou o Pedrinho pela gola da camisa. Depois de umas quatro ou cinco chacoalhadas, recebidas pelo agredido cavalheirescamente, cuspiu: “Veja o que você fez, velho gagá, você vai vender sua casa para pagar meu carro”. Depois de um saco de palavrões, botou o Pedro no chão, com violência. Mas nosso amigo não se abalou. Tomou fôlego, olhou para aquele monte de banha e respondeu, baixinh “Pois fique o senhor sabendo que foi uma honra para mim bater num carro tão bonito assim”. Acontece que por ali passava o Edgarzinho, naquele tempo famoso vereador pelos favores prestados aos amigos e à comunidade. Vendo que as coisas iriam engrossar mais, apelou para o Heli, goleiro do Independente e militar. Era preciso salvar o Pedrinho daquela encrenca. Muita conversa e, por sorte ou não, foram todos para a Delegacia. Nosso vereador arrebanhou mais uns quatro ou cinco amigos, todos eles “testemunhas oculares”, de farda e prontos para o que desse e viesse. O que aconteceu lá eu de nada soube e nem me contaram. O que ficou sabido é que deram razão ao Pedrinho. O verdadeiro culpado foi o dono do Cadillac. Falado e provado. O gordão pagou tudo e ainda levou bronca do Delegado, que, por coincidência, era também amigo do Edgarzinho.

Moral da história: quando se tem amigos, até a lei coopera. Como sempre avisa o Dr. Manuel Eugênio Prata Vidal Leite Ribeiro, “ganha sempre que tem as melhores informações e os melhores contatos”...

(*) Membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro

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