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A Janela de Overton

Lembrei-me da Janela de Overton ao tomar conhecimento do ato do presidente

Márcia Moreno Campos
Publicado em 22/03/2015 às 11:57Atualizado em 17/12/2022 às 00:54
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Lembrei-me da Janela de Overton ao tomar conhecimento do ato do presidente da Câmara dos Deputados que, em uma só canetada, elevou para os seus pares a verba de gabinete e o auxílio-moradia, além de criar o “bolsa-cônjuge”, concedendo passagens aéreas gratuitas para as esposas e maridos dos deputados/deputadas. Diante da reação contundente e imediata da opinião pública, através da imprensa e das redes sociais, ele recuou dias depois, retirando do pacote a concessão das passagens aéreas. Nada se falou do aumento das verbas de gabinete e auxílio-moradia, corrigidas, segundo ele, pelo índice da inflação. O povo reagiu contra uma injustiça (a concessão das passagens) e deixou perpetuar outras por não mostrar veemente indignação, mesmo quando esses mesmos deputados negaram aos trabalhadores assalariados o mesmo índice de correção, de forma uniforme, à Tabela do Imposto de Renda das Pessoas Físicas, sob o argumento de contribuir para o ajuste fiscal. Defendido o deles, o povo que se dane.

A Janela de Overton registra como pensa a maioria da sociedade num dado momento sobre determinado assunto. O termo é uma homenagem a Joseph P. Overton, que criou um modelo para demonstrar como um pequeno grupo de pensadores pode mudar intencional e gradualmente a opinião pública. A Janela de Overton é o leque de ideias aceitáveis na sociedade. O que temos vivenciado no Brasil nos últimos 12 anos é uma prova de como nossos conceitos, tolerância e limites foram manipulados e testados à exaustão, com reflexos positivos para os manipuladores. Fomos expostos a uma gama de discursos vazios que sempre visaram implantar uma luta de classes a ponto tal que qualquer um de nós, ao se opor às políticas do governo, é imediatamente tachado de elite e de ser contra os pobres. Quem ousa discordar do “grande guia” é um invejoso que não conseguiu admitir a ascensão de um trabalhador ao Poder. Essas inverdades foram marteladas sem dó por anos a fio, provocando como consequência, um deslocamento na Janela de Overton, ao nos tornar passivos, submissos, tolerantes. A reação popular aos ensaios nos apresentados interfere no resultado de forma clara. O governo lança seu pacote de maldades e testa como vamos reagir. Se colar, colou. Se reagirmos, mudaremos posições.

Essa técnica da Janela pode modificar nossas vidas. A manipulação tem por objetivo fazer com que nossas ideias pensadas anteriormente pareçam radialmente incorretas. Nos últimos anos, nossas consciências foram se abrindo a ponto de acharmos normal a corrupção (já que todos roubam); o caixa dois de campanha; ministro da Justiça ao lado dos réus; STF com dez membros, porque a ocupada Presidente não indica o décimo primeiro (o que interfere no resultado das votações), e outras barbaridades que jamais pensamos em aceitar. Estamos sendo manipulados, minha gente, num efeito elástico assustador. Mude a Janela e mude o debate. Tenho esperança no resultado das manifestações do último dia 15 de março e de outras que virão. Nossa mudança tem que ser radical, da complacência à total intolerância à corrupção.

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