ARTICULISTAS

Morte indigna e morte digna

Impossível para quem escreve ignorar fatos como o assassinato da jovem mãe uberabense

Vera Lúcia Dias
Publicado em 20/02/2015 às 19:55Atualizado em 17/12/2022 às 01:21
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Impossível para quem escreve ignorar fatos como o assassinato da jovem mãe uberabense Izabella Gianvechio, juntamente com seu casal de filhos gêmeos, com apenas dois meses de vida, e, como se isso fosse pouco, tendo como principal suspeito o suposto pai dos mesmos.

Não há como não nos chocar com esse crime, independente do ângulo que ousemos examiná-lo. Novas vidas surgidas de um “pai” assassino, que, segundo o divulgado, mentiu sobre sua identidade e condição civil. Má-fé, premeditação e falta de caráter do autor, aliadas à pouca idade e inexperiência da vítima, engravidando-se de quem pouco conhecia.

Não quero enveredar pelos caminhos do julgamento e rotulações, mas gostaria de me ater ao tema que melhor conheço e me sinto mais segura.

Estava com o artigo da quinzena escrito quando surgiram esses novos fatos. Nele eu relatava um paradoxo vivido na semana anterior.

De um lado, os caminhos profissionais levaram-me ao recôndito de uma família à moda antiga, daquelas que abrigam harmoniosamente sob o mesmo teto quatro gerações. Tal família pranteava com desespero a morte de seu caçula, com apenas dezoito anos, num acidente que, numa infeliz combinação de fatores, os levou até o local e, numa experiência inimaginável, ainda seguraram as mãos da vítima, que clamava por socorro.

Morte sofrida e precoce de um broto em germinação, arrancado da vida e enterrando consigo sonhos e projetos. Sua perda, assim como a de Izabella, só poderá ser superada com o tempo, o amor e a união entre os que ficaram.

Dois dias depois estive no velório de um patriarca que teve sua morte à moda antiga, natural, com quase cem anos de vida, sem apressamentos ou adiamentos, no próprio lar onde também foi velado. Morte que chegou a seu tempo, como árvore que cumpriu sua missão e tombou, deixando sementes espalhadas e germinadas nos filhos, netos e bisnetos.

Pouco pude fazer pela primeira família, a não ser acolher com amorosidade suas expressões de dor, garantir-lhe que seu desespero era normal na situação vivida e tentar infundir-lhe o sopro da esperança de que feridas emocionais também são curáveis.

Para a segunda, pude ser presença naquele encontro de despedida que exalou a serenidade das missões cumpridas: a do pai, por ter dado vida, sustento, orientação, exemplo e sabedoria, e a dos filhos, por terem retribuído, até o momento final, essas tantas bênçãos recebidas.

Outro dia, Marco Antônio Figueiredo comentou em um artigo que nós na casa do “enta” temos sido reiteradamente saudosistas em nossos escritos. Concordo com ele e fico pensando que gostaria de viver num tempo de menos violência e em que não assistisse a tantos pais enterrando seus filhos de mortes indignas, como as da Izabella, de Uberaba; da outra – a Nardoni, de São Paulo; da Virlânea Lima, da Nathália Dayrel e de tantas outras vidas jovens ceifadas em condições indignas e que vão caindo no esquecimento do grande público, fazendo com que somente seus familiares e amigos saibam da dor e da falta sentida.

Que esses falecidos encontrem a luz e seus pais, a serenidade necessária para continuar vivendo!

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