Adversários ou Inimigos?
É comum, entre nós, a confusão que se faz entre adversários e inimigos.Nosso organismo evoluiu de maneira a manter nossos componentes bioquímicos dentro limites bastante estreitos. Assim, para que isto se tornasse realidade, foi necessário o surgimento no organismo de substâncias com funções antagônicas que eu chamo de nobres adversários.
Os problemas surgem quando esses limites fogem do controle. Um exemplo clássico é o que ocorre com a glicose, uma importante fonte de energia para o organismo. Tanto o aumento como a diminuição da concentração desse açúcar no sangue podem causar danos, às vezes, irreparáveis para o nosso organismo. O aumento (hiperglicemia), já bastante conhecido da população, aparece no Diabetes, com todas as suas complicações. Porém, a diminuição é, também, muito grave. O cérebro, para manter suas demandas energéticas, alimenta-se quase que exclusivamente de glicose e sua queda (hipoglicemia), muito abaixo dos limites da normalidade, leva, inevitavelmente, para o coma e morte.
Para manter a glicose dentro de seus limites considerados normais, dois grandes adversários entram em ação – a insulina de um lado e o glucagon, do outro. Esses dois hormônios são produzidos por células diferentes de um mesmo órgão – o pâncreas. A insulina, que é hipoglicemiante, trabalha para diminuir a glicose no sangue, quando esse açúcar ultrapassa o seu limite superior. Por outro lado, o glucagon que é hiperglicemiante, trabalha para aumentar a glicose no sangue, quando esse açúcar cai abaixo do seu limite inferior. Esse é um trabalho fantástico de retroalimentação (feedback) realizado por dois adversários. Entretanto, o diabético considera a glicose como inimiga.
A pressão arterial pode ser mantida, entre outros mecanismos, dentro de seus limites de normalidade, por dois outros adversários – a angiotensina e a bradicinina. A angiotensina, descoberta por um cientista chileno, naturalizado argentino – Eduardo Braun Menendez –, eleva a pressão arterial. A bradicinina, descoberta por um cientista brasileiro – Maurício Rocha e Silva –, abaixa a pressão arterial. No entanto, quando argentinos e brasileiros se encontram dentro de um campo de futebol , infelizmente, já não se fala em adversários e sim em inimigos – é uma guerra.
Poderíamos citar, aqui, vários exemplos de adversários que trabalham dia e noite para manter o equilíbrio do meio interno do nosso organismo. Infelizmente, os homens caminham na contra mão desses legados das células e, ao invés de reunirem suas adversidades para atingirem o bem comum, preferem ser inimigos, não só entre si, mas também da natureza, caminhando para um anátema inexorável.
Valdemar Hial