Não sou saudosista nem acho que só é válido, bom e bonito o que é do passado
Não sou saudosista nem acho que só é válido, bom e bonito o que é do passado. A nostalgia tem seus limites e pode levar ao ridículo. Mas, nossos antepassados estavam carregados de razão quando diziam que “hoje há mais conforto, carros sofisticados, celulares, televisão, mais recursos médicos, geladeira, computadores e tudo o mais. Mas, antigamente, havia mais amizade.” Até onde vai a verdade na queixa?
Não sei até onde aceitar a afirmação, mas não me esqueço de certas imagens, muito diluídas no tempo. Cadeiras nas calçadas, conversas despreocupadas, sorrisos, trocas de informações, troca de quitandas e o tempo escorregando macio, silencioso... Era a riqueza do cotidiano. O povo era povo. Gente era gente. Vizinho era de casa. Entrava e saía. Sem pedir licença.
O que acontece é que estamos perdendo o sentido de comunidade. Estamos tornando-nos “massa informe”. Uma violenta invasão tecnológica tomou-nos de surpresa e nos desorientou. Nossa preocupação não é mais “viver”, mas “sobreviver”. É ganhar o necessário para atender a tudo aquilo que uma sociedade de consumo exige de nós através de uma bem elaborada propaganda. Custe o que custar, é preciso acumular. Aparentemente nós nos encontramos, passamos uns pelos outros, nos esbarramos, mas nunca estivemos tão separados. Nossos vizinhos e nossos amigos foram substituídos pelos aparelhos de televisão. Pelos jogos eletrônicos. Pelas novelas.
Tudo isto para dizer que corremos um perigo muito grande: o perigo do isolamento. Estamos cercados de gente por todos os lados, mas nos sentimos tremendamente sós. Não sabemos o que fazer de nossa vida. Somos como que garrafas atiradas no mar, cercadas de água por todos os lados, mas terrivelmente vazias.
A Sociologia contemporânea se preocupa com o problema “comunidade”. Essa mudança de gravitação do homem em nossos dias – do eixo comunidade para o eixo indivíduo – deixa preocupados os cientistas sociais. A característica essencial da comunidade é a participação, a consciência, a ação comum. Só existe comunidade quando os membros se conhecem pessoalmente. Comunidade é muito mais do que um conceito espacial, geográfico. É muito mais do que um aglomerado de pessoas, um ajuntamento ou uma justaposição.
Comunidade é encontro de pessoas em nível de consciência e em clima de afetividade. Quando as pessoas se conhecem e se deixam conhecer, elas não se isolam. Quando você sai de si mesmo ou de si mesma e procura criar laços, você jamais se isolará. Aproximar-se é criar laços. Assim, tudo vai se tornando mais claro e você se liberta de sua solidão. De sua dor. De sua “fossa”. O sofrimento vem de dentro de você. Não vem de fora.