CIDADE

Diploma para quê? Recém-formados migram de profissão diante da falta de vagas

Motivo que leva à mudança de profissão é a imaturidade no momento da escolha do curso, segundo especialistas

Marília Mayer
Publicado em 06/01/2020 às 18:51Atualizado em 18/12/2022 às 03:18
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“Pensava que logo que formasse, já teria um emprego ‘me esperando’, principalmente, porque o mercado da construção civil estava em alta. Quando saí do curso, me senti um pouco perdida em relação ao que fazer e, ao me deparar com a atual realidade do mercado, hoje foco mais em concursos”, contou Gabryella Silva, formada em Engenharia Civil há dois anos.

Enquanto estuda para concursos, a jovem de 26 anos – que nunca atuou no segmento de sua formação – trabalha fazendo doces gourmet para pagar as contas do mês.

A história dela ilustra a de milhões de brasileiros que terminam um curso de graduação e estão trabalhando menos horas do que gostariam, desalentados ou desempregados. Pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) mostrou que são 2,5 milhões de jovens vivendo essa realidade em 2019, ao passo que em 2014, eram 930 mil.

Para a psicóloga e consultora em Recursos Humanos Luciene Villa Maia, esse cenário é muito mais comum do que se imagina e a tendência é que seja ainda mais recorrente.

“Hoje nós temos um leque gigantesco de opções e também tem um momento de grande imaturidade desse aluno que, às vezes, sai do ensino médio com 17 anos de idade. O ensino médio nem sempre forma para o mercado de trabalho considerando as possibilidades de escolha. Então, as vezes ele entra em uma profissão que acha mais fácil ou que tem influência na família e colegas e, durante o curso, gosta muito e termina achando que vai atuar ou segue as possibilidades que o mercado sinaliza e que são fora dessa formação”, disse em entrevista ao JM Online.

Além da imaturidade no momento da escolha da profissão, o poder aquisitivo, as sinalizações do mercado quanto a áreas em crescimento de demanda e a crise financeira a qual o país se encontra são questões que influenciam. Ainda, o aumento de pessoas que conseguiram um diploma universitário nos últimos tempos é outro fator que deve ser considerado.

Na análise da especialista, atualmente, os profissionais buscam sucesso financeiro deixando de lado, muitas vezes, as habilidades e o prazer com o trabalho.

Mas quando se toca nesse tema é preciso pensar em diversos cenários. Não é rara a descoberta de outras opções profissionais depois que já se está frequentando a universidade.

Foi o que aconteceu com Karla Fernanda. Aos 30 anos, ela está na reta final do curso de Psicologia. Ela se formou há oito anos em enfermagem, ainda atua na área, mas resolveu apostar em um segundo curso superior.

“Quando eu resolvi migrar foi, num primeiro momento, por observar o quanto são profissões complementares. Eu escolhi ir para a Psicologia não porque eu não me identifico com a Enfermagem. Foi porque sendo enfermeira eu senti a necessidade de um conhecimento maior para conseguir ajudar mais meus pacientes. Hoje todos me perguntam se vou abandonar para seguir só com a Psicologia, minha resposta é não, eu pretendo continuar dentro dos dois segmentos”, explica. Profissionais são descartados de postos de trabalho por terem formação superior

Reprodução/Facebook

Fúlvio Ferreira, especialista em coaching e liderança, afirma que nem todos que fazem um curso superior têm a dedicação ideal e acabam não absorvendo tudo que a profissão exige

A opção da engenheira civil Gabryella Silva por vender doces não foi pelos benefícios de ser autônoma. Além de não conseguir ocupação na construção civil, ela não passa nas entrevistas para outros tipos de funções por ter um diploma.

“Infelizmente aqui na cidade, as pessoas que conseguem emprego na área são por indicações. E a dificuldade de encontrar um emprego fora da área é que quando veem que tenho uma formação diferente da vaga oferecida, questionam por que estou buscando esse emprego e logo descartam”, desabafa.

Especialistas em recrutamento e seleção admitem que existe essa análise dentro dos processos. Porém, defendem que não tem a ver com a pessoa ter formação superior e sim com uma questão de retenção. Ou seja, as empresas avaliam que aquele trabalhador sairá logo que encontrar uma oportunidade melhor.

Como saída para situações como essa, a recomendação do especialista em coaching e liderança Fúlvio Ferreira é para que as pessoas tenham sempre dois currículos para apresentação.

“Tenha um currículo bacana com a sua titularidade e o conhecimento que você tem para a vaga que você merece e um mais simples para a vaga que lhe serve. Se for entrar em uma empresa com plano de carreira e opção de crescimento fica mais fácil e, talvez, nem precise omitir informações”, orienta.

Embora a qualificação em determinada área possa diminuir ou excluir as chances de emprego em outro segmento, o despreparo dos candidatos mesmo com graduação foi destacado tanto pela consultora em RH Luciene Villa Maia quanto pelo especialista em coaching e liderança Fúlvio Ferreira.

“Muitos fazem o curso e nem sempre muito bem feito. Infelizmente tem muitas pessoas com graduação, até pós-graduação, e que conjuga de maneira errada os verbos. Acontece muito isso”, afirma Fúlvio Ferreira.

“Tem 30 anos que trabalho na área de gestão de pessoas, hoje eu vejo um preconceito muito menor do que antes no mercado de trabalho”, defende Villa Maia.

A orientação dos especialistas é que os candidatos continuem atualizados, independentemente de estarem ou não atuando na área em que desejam.

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