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Entrevista: Novo reitor da UFTM defende o diálogo para superar diferenças

Na quarta-feira (19), o professor Luiz Fernando dos Santos Anjo tomou posse como reitor da UFTM

Publicado em 22/06/2019 às 13:05Atualizado em 17/12/2022 às 21:53
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Na quarta-feira (19), o professor Luiz Fernando dos Santos Anjo tomou posse como reitor da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, em cerimônia realizada no Ministério da Educação, em Brasília. O decreto, assinado pelo presidente Jair Bolsonaro e pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub, foi publicado na véspera (18). O novo reitor foi escolhido pelo governo federal por meio de uma lista com três nomes. A troca da gestão deveria ter ocorrido em junho do ano passado, porém, por conta de denúncias relacionadas ao processo de consulta informal, foi adiada até este mês. Graduado em Engenharia Civil, Luiz Fernando é mestre e doutor em Engenharia Civil, na área de Concentração em Recursos Hídricos. Professor-adjunto, vinculado ao Instituto de Ciências Tecnológicas e Exatas (ICTE), no Departamento de Engenharia Civil, ministrando aulas para os cursos de Engenharia Civil, além de atuar como professor do Programa de Mestrado Profissional em Inovação Tecnológica da UFTM. Foi coordenador do Curso de Engenharia Civil da UFTM, diretor do ICTE da UFTM e vice-reitor. Na entrevista de hoje, Luiz Fernando conta como foi indicado para a lista tríplice, do desafio de dirigir uma universidade com poucos recursos e de seus planos à frente da UFTM.

Jornal da Manhã - A nomeação foi por meio da lista tríplice, um processo demorado e polêmico... Como é ser escolhido reitor sem ter participado da consulta informal encabeçando a chapa?

Luiz Fernando - Na verdade, eu participei da consulta informal pela reeleição junto com a professora Ana Lúcia Simões como reitora. Na consulta informal, nós identificamos algumas questões graves de interferência no pleito, entre elas, troca de cédulas. Vários professores e técnicos nos procuraram, afirmando que votaram em cédulas trocadas, inclusive entregaram documentos e fizeram vídeos com essas afirmações. Percebemos que das 23 ou 24 urnas, à época, em 13 ou 14 o número de cédulas não coincidia com o número de assinaturas, além de outras ocorrências registradas no pleito. Achamos que a consulta informal foi marcada por falhas e algumas evidências apontaram para fraude no processo. Decidimos concorrer pela lista tríplice na votação formal, que é realizada pelo Conselho Universitário. A reitora não quis participar da votação formal, e foi quando decidimos que eu me candidataria para a lista tríplice, respeitando toda a legalidade do pleito. Fui um dos nomes indicados e posteriormente escolhido legitimamente para ocupar o cargo. 

JM - Devido a todos esses problemas no processo eleitoral, o senhor acredita que o sistema de consulta informal deve continuar?

Luiz Fernando - É importante lembrar que se trata de uma consulta informal. Ela precisa seguir os critérios e normas estabelecidas pelo MEC. No entanto, o que prevalece é a votação do Conselho Universitário, que conta com representantes das categorias discente, docente e técnicos. Esses representantes são eleitos pela comunidade e exercem seu voto. Até o momento a regra válida pelo MEC é esta e deve ser respeitada. O sistema de consulta informal deve ser revisto, pois em diversas instituições, assim como na UFTM, foram registradas denúncias de falha no processo. Sobre o processo na UFTM, no ano passado o MEC lançou uma nota técnica, informando que a consulta informal deveria respeitar 70% de peso para o docente. O que acontece é que em muitas universidades federais, inclusive a nossa, usou-se muito a questão da paridade, que é o mesmo peso de votos para docentes, técnicos e discentes. Quando o MEC lançou essa nota técnica, que, se não me engano, fala que se não fosse aplicada a fórmula correta, seria utilizada a equação usando o peso de 70% para docentes. Inclusive, nessa consulta informal nossa, se aplicasse a equação correta que o MEC estava exigindo, teríamos vencido o pleito na consulta informal, porque tivemos a maioria dos votos nas categorias docente e técnico-administrativo. Eu acho que daqui pra frente, talvez seja um pouco prematuro dizer, mas se as universidades seguirem a consulta informal, respeitando o peso de 70%, será valido, sim. 

JM - A chapa derrotada emitiu uma nota afirmando que será resistência... Como será feita a interlocução com a oposição?

Luiz Fernando - Sempre fui uma pessoa muito acessível, sempre procuro conversar e tento tomar decisões colegiadas, especialmente para temas mais polêmicos. A oposição existe em qualquer setor, se você se candidatar para qualquer cargo, tem oposição. Mas existe aquela oposição construtiva, pensando no bem da universidade, e aquela destrutiva, vamos dizer assim. Então, acho que travar qualquer processo não seria legal na universidade ou qualquer outro órgão. Talvez os ânimos estejam inflamados agora, mas se dialogarmos com as pessoas, não vejo problema nesse sentido no decorrer da minha gestão. 

JM - O histórico dos alunos da universidade é de bastante militância, já fizeram vários movimentos e, na época, sentiram a reitoria fechada em relação às demandas. Como será o trato com alunos e professores militantes?

Luiz Fernando - Importante esclarecer que a reitoria nunca esteve fechada aos alunos. Mesmo como vice-reitor, eu sempre dei aulas e fui uma pessoa acessível. Nos últimos anos tivemos reuniões com os representantes discentes, que apresentaram suas demandas. Aquelas que estavam dentro do permitido por lei e dentro das possibilidades orçamentárias da UFTM foram atendidas. É claro que nem todas as demandas apresentadas são possíveis, amarradas ao cenário econômico atual e às restrições orçamentárias. A Proace tem e-mails da época que comprovam que os diretórios acadêmicos eram chamados para reuniões. 

JM - No dia 30 de abril, o Ministério da Educação falou sobre a possibilidade de corte ou contingenciamento de recursos. Qual será a postura diante dessa situação?

Luiz Fernando - Desde que assumi a vice-reitoria, no fim de 2014, nós entramos em 2015 com crise instaurada no país. Com a reeleição da presidente Dilma Rousseff, começaram vários cortes. Sempre tivemos que lidar com isto, gerir todos os recursos com esses cortes. Agora, nós já começamos a nos preparar, estamos fazendo uma análise minuciosa dos recursos para conseguirmos ter o impacto negativo mínimo possível, estamos acostumados a lidar com esse cenário. Nos últimos anos a UFTM foi uma das poucas universidades públicas que conseguiram virar o ano sem estar no vermelho. Sempre pagamos nossos fornecedores e não deixamos dívidas para outro ano.

JM - A ex-reitora Ana Lúcia afirmou em entrevista que a UFTM não tem dinheiro a partir do mês de setembro, independentemente do contingenciamento. Como serão as atividades a partir dessa data?

Luiz Fernando - Como viemos sofrendo cortes ao longo dos anos, vai chegando uma hora que a gordura vai secando, mas estamos reavaliando todas as atividades, pensando em algumas outras economias de partes que interferem em custeio, não tem muito o que fazer nesse sentido se o corte ocorrer. O que tentamos é agendar uma reunião com o ministro da Educação, vamos apresentar a situação da universidade e mostrar que sempre fizemos nosso dever de casa, mantendo a UFTM nos trilhos e pagando as contas. Vamos pedir recursos para atender demandas específicas. Paralelamente a isto, estamos sempre tentando parcerias e também emendas de bancadas com deputados, estaremos sempre correndo para conseguir recursos e suprir as demandas. 

JM - São dois cenários: com e sem contingenciamento. Em um cenário favorável, como serão as atividades a partir de então?

Luiz Fernando - Se não tiver o contingenciamento, conseguiremos passar o ano no azul. O que temos de torcer é para que a economia cresça novamente e que a UFTM consiga mais recursos, no futuro, para atender demandas que nós temos. Na parte de investimentos, existem algumas construções que gostaríamos de concretizar, mas isso em médio prazo, quando o cenário começar a melhorar. É uma situação macro e não um caso específico da UFTM. 

JM - E em caso de contingenciamento?

Luiz Fernando - Eu não acredito que chegaremos a esse pior cenário, acho que esse contingenciamento não vai virar corte. Mas se pensarmos no pior cenário, podemos, sim, chegar a uma situação de não conseguir pagar fornecedores, e aí seria necessário rever e avaliar cada caso. Mas a universidade não pararia, algumas atividades podem ser revistas. Todo corte, quando acontece, gera um aspecto negativo, e quando a gente fala que pode afetar, seria no ensino, pesquisa e extensão. 

JM - O ministro da Educação recentemente falou sobre a existência de balbúrdias nas universidades... Existe na UFTM? Como combater?

Luiz Fernando – No meu ponto de vista, balbúrdia são manifestações que prejudicam a universidade a realizar suas atividades. Na UFTM, as invasões que ocorreram, assim como pichações e destruição do patrimônio público, se enquadram nisso, e por isso não discordo do ministro. Acho que tem que ter o diálogo, temos que apresentar às pessoas envolvidas o real cenário, acho que quanto mais se dá informação daquilo que está acontecendo, as pessoas têm mais consciência, mas os dois lados precisam estar dispostos ao diálogo. Quando eu assumi a direção das engenharias em 2011, só tinha um ano das engenharias, nós estávamos em uma fase de implantação do campus da Univerdecidade, pegamos um período longo de obras, e eu sempre tive um diálogo com colegas e alunos e nunca tive problema com relação à questão de por que algumas demandas não foram atendidas. 

JM - Fala-se muito sobre doutrinação ideológica nas instituições de ensino do país. Em sua vida acadêmica percebeu isso? Tem alguma postura definida diante dessa situação?

Luiz Fernando - Eu, quando era aluno de Engenharia Civil, nunca percebi isso. Cada um tem a liberdade de expressão, essa questão de doutrinação é algo muito polêmico. Sabemos que já aconteceram casos em algumas universidades, aqui já aconteceram algumas denúncias que foram devidamente apuradas. A universidade conta com Comissão de Ética, Comissão Permanente de Procedimentos Disciplinares e Ouvidoria, que são alguns dos canais nos quais esses casos podem ser denunciados. A UFTM tem realizado seu trabalho com cuidado. 

JM - A UFTM foi criada a partir da Faculdade de Medicina e existia a proposta para se fazer uma instituição apenas na área da Saúde. O fato de não ter formação em medicina gera problemas?

Luiz Fernando - Com certeza não. Meu pai é formado em Medicina, Manoel dos Santos Anjo Filho, foi aluno aqui, na turma de 70, e, por coincidência, o universo conspirou para isso e eu estou aqui. A própria ex-reitora não é médica - tudo bem que ela é da área da Saúde - e nós tivemos uma convivência muito boa com o pessoal da Saúde. Os médicos me conhecem, os professores aqui sabem da forma que eu lido. Acho que estou tendo um apoio muito grande da área médica, por parte dos professores e técnicos envolvidos.

JM - Quais serão os projetos prioritários da gestão?

Luiz Fernando - Nós temos um problema ainda na questão de aluguéis. Em 2005, quando o governo criou o Reuni, nós não tivemos um intervalo para construir, contratar e abrir vestibular. O antigo reitor, professor Virmondes, brincava que, naquela época, como chegava tudo ao mesmo tempo, os professores, os alunos e as obras, era como trocar o pneu furado de um carro com ele rodando. Então, até hoje nós temos alguns pontos alugados porque estamos aguardando algumas obras ficarem prontas, e algumas já estão prontas, mas têm que ser ocupadas também. As coisas são muito dinâmicas. Uma meta em curto prazo é inaugurar e ocupar esses prédios e começar a entregar alguns aluguéis, para diminuir o nosso custeio. Existem outras obras que nós temos intenção de fazer, inclusive que queríamos para essa gestão. Uma delas é a construção de galpões para o nosso almoxarifado, que atualmente está em área alugada. Nós temos também uma demanda antiga da oficina mecânica das engenharias, que é para dar suporte ao laboratório, um projeto de expansão do próprio Hospital de Clínicas em uma parte do Uberaba Tênis. Eu poderia citar várias demandas. Vamos sempre buscar recursos e formas de viabilizar essas obras. Importante ressaltar que não temos nenhuma obra parada, nenhuma obra com esqueleto encostado, aguardando recursos para dar continuidade. Temos obras acontecendo a todo vapor em Iturama, que é um campus que foi inaugurado há pouco tempo, em 2015, estamos construindo uma sede grande lá e que vai ser excelente para a região.

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