(...) nunca fui verdadeiramente menino e nunca fui verdadeiramente moço. (...)
“(...) nunca fui verdadeiramente menino
e nunca fui verdadeiramente moço. (...)”
Em tempo de campanha política e de eleições e em tempo de comemoração do “Dia da Criança” – 12 de Outubro – é tempo também de se pensar na criança e refletir sobre a infância.
Na sociedade medieval, não existia a distinção da criança e do adulto. Até o século XVIII, os trajes das crianças e dos adultos eram iguais. Conforme a condição social, as vestimentas infantis remetiam às vestimentas dos adultos, como corpetes apertados, saias pesadas e rodadas, e coroa na cabeça, quando nobres. Adultos em miniatura, as crianças eram incluídas em atividades dos adultos como orgias e enforcamentos públicos, inclusive. Até o final do século XIX, o Brasil foi chamado de país sem crianças. Olavo Bilac, em 1908, escreve:
“(...) nunca fui verdadeiramente menino e nunca fui verdadeiramente moço. A cousa não teria importância se fosse uma desgraça acontecida a mim somente, mas foi uma desgraça que aconteceu a toda uma geração. Toda a gente do Rio, que tem hoje a minha idade, deve estar sentindo, ao ler essas linhas, a mesma tristeza. Fomos todos criados para gente mocambúzia, e não para gente alegre. Nunca nos deixavam gozar essas duas quadras deliciosas da vida em que o existir é um favor divino. Os nossos avós e os nossos pais davam-nos a mesma educação que haviam recebid cara amarrada, palmatória dura, estudo forçado e escravização prematura à estupidez das fórmulas das regras e das hipocrisias (...). É preciso estar quieto! É preciso ser sério, é preciso ser homem! Tanto nos recomendaram isso, que ficamos homens. E que homens! Céticos, tristes, de um romantismo doentio...” (Bilac, 1908).
O século XX reconheceu a criança com seu status de ser em desenvolvimento, tendo em vista as inúmeras pesquisas sobre a infância no campo científico. A criança ganha espaço no cenário cultural e social.
Reflexo da revolução industrial, as palavras “criança” e “infância” só ganharam o sentido que lhe atribuímos a partir do individualismo moderno.
Em pleno século XXI, entretanto, parece que o lugar da criança vem sendo usurpado, observando-se a forma como as crianças têm sido vestidas, e o modo como estão sendo medicadas, tratadas como adultos pequenos que tomam Ritalina, medicamento excessivamente usado em casos de hiperatividade infantil. A “droga da obediência”, usada para adormecer as crianças e só deixá-las acordar quando virarem adultos.
No século XXI, observa-se algo semelhante à época medieval. As crianças têm adquirido todo um arsenal material e tecnológico como tablets, computadores, celulares de última geração, um excesso de informação e objetos de consumo. “O mundo em que o gozo está em primeiro plano é um mundo com dificuldades de encontrar seus limites.”
Como se sentem estas crianças?
O que as políticas públicas pensam a respeito?
(*) Psicóloga Clínica