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Para bom entendedor…

Renato Muniz Barretto de Carvalho
Publicado em 12/12/2022 às 18:51Atualizado em 26/12/2022 às 22:56
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Nos anos 1960, televisão era artigo de luxo que só viria a se popularizar na década seguinte, mais de trinta anos depois de chegar ao Brasil. A construção de uma rede de antenas nas grandes capitais, e em todo o país a partir do eixo Rio-São Paulo, contribuiu para sua expansão. Sua disseminação promoveu as telenovelas e os programas de auditório, sem falar dos seriados norte-americanos, os “enlatados”. Com o impulso dado, as transmissões dos jogos de futebol e as notícias propagaram-se país afora, alcançando variados segmentos sociais. A televisão conquistou o público brasileiro, sem desbancar o rádio, até então o meio de comunicação mais difundido entre a população.

Os jornais impressos, existentes desde o começo do século XIX, estavam restritos a grupos específicos, às associações empresariais, profissionais ou agremiações sindicais e políticas. No início do século XX, raramente as tiragens ultrapassavam cem mil exemplares no conjunto dos veículos existentes. Importante lembrar que a imprensa esteve proibida no país até 1808.

No início, difundida como hábito urbano, a leitura de jornais e de revistas, bem como a audiência da televisão, não atingia todo o país. Muita gente deve imaginar que as propriedades rurais estavam alheias ao que acontecia no mundo. Não era essa a realidade da fazenda do meu avô. As notícias chegavam, apesar de alguma demora. O rádio tinha forte presença; era rara a residência que não tinha um radinho. Se não era elétrico, funcionava a pilha – um item básico nas compras das famílias. A ausência da eletricidade não impedia ninguém de manter o aparelho ligado, às vezes o dia inteiro.

Na casa do vaqueiro Bastiãozinho, o rádio começava sua falação antes mesmo da esposa acender o fogão para coar o café. Ainda estava escuro e os locutores despejavam notícias, músicas, recados e comentários diversos sobre tudo. Quando o dia clareava, já se sabia quem nasceu, quem morreu; se o preço do leite e da saca de milho abaixou ou aumentou; que o armazém do Zé estava com grande estoque de bebidas finas para as festas de fim de ano, entre outros assuntos. Eventualmente, os recados tinham destinatário cert fulana mandava avisar que chegaria no dia tal, sicrano comunicava que o parente tinha sido internado no hospital ou que o sobrinho tinha se mudado para a capital. Era algo de dar inveja às redes sociais nos dias de hoje.

Outra maneira de saber as notícias era através do leiteiro. O motorista do caminhão que recolhia o leite nas fazendas, percorrendo longas e precárias estradinhas de terra até chegar à cooperativa ou à empresa que recebia o produto para pasteurização e transformação em deliciosos queijos, dava notícias de tudo.

Falta de informação é problema tão preocupante quanto a dificuldade de interpretar as notícias. A apropriada compreensão da realidade permanece um gargalo para a sociedade brasileira e obstáculo à superação de históricos problemas estruturais. 

Renato Muniz Barretto de Carvalho

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