ARTICULISTAS

Achados e perdidos

Na arrumação doméstica sazonal sou incumbido de selecionar, em minha estante, objetos, impressos, revistas...

Luiz Cláudio dos Reis Campos
lucrc@terra.com.br
Publicado em 19/03/2012 às 19:29Atualizado em 19/12/2022 às 20:42
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Na arrumação doméstica sazonal sou incumbido de selecionar, em minha estante, objetos, impressos, revistas e livros que podem ser dispensados para a boa acomodação dos guardados, uma espécie de achados e perdidos que de tempos em tempos são peneirados pelo bem da organização da casa. Esta tarefa recorrente a cada quadra de ano remete-me a diversas etapas de meio século de minha existência. Mexo, remexo e acho que conseguirei desfazer de muita coisa que junto por anos e anos. No entanto, as recordações superam a praticidade e falam mais alto, impedindo o desfazimento da maioria dos guardados que ganha fôlego até a faxina seguinte. Parece que preservar por perto fragmentos de minha vida conforta-me e assegura-me de não perder contato com a linha do tempo. Sei que ao final de cada inspeção e seleção, concluído o trabalho, postergo a sobrevida de quase tudo. É tão agradável deparar com um cartão de aniversário enviado por um ente querido, reler uma carta escrita à mão, rever um cartão postal, um retrato em branco e preto ou em cores da turma da escola, dos amigos dispersos pelo mundo afora, do time de futebol. Também é valioso poder tocar cada foto, livro, revista, anotações, sentir o cheiro do tempo que exala da ampulheta que insisto em manter na estante.

Desta vez chamou-me especial atenção e atraiu-me para as profundezas de suas páginas incontáveis de doze volumes, a enciclopédia Delta-Larousse que ganhei de presente de aniversário de minha querida e saudosa mãe ao completar onze anos de idade. Folheei aleatoriamente diversos livros de sua dúzia. Manuseando-os cuidadosamente embarquei no trem do retorno, a viagem inconsciente que nos descola do atual e nos transporta de volta em busca de nós mesmos, espécie de ajuntamento de peças do nosso mosaico existencial.

Vi e li tanta coisa do Mundo guardado na enciclopédia desde os primórdios até 1970. Lá está um inestimável arsenal de informações, cuja busca era um deleite na medida em que satisfazia nossa curiosidade e nos respondia as dúvidas e questionamentos que tínhamos em nossa vida de estudante. A enciclopédia impressa era o grande instrumento de busca. A revolucionária internet, fundamental em nossas vidas, tornou-a obsoleta e com isto desapareceu o vendedor de enciclopédia. Lembro-me, como se agora fosse, da visita do vendedor de enciclopédia, tanto no dia da compra quanto no da entrega, este último de imensa alegria. Rendo homenagem à figura importante do antigo vendedor de enciclopédia para diversas gerações e a tudo de positivo que também sucumbiu diante da implacável força do progresso e da tecnologia. Revigorado por preservar praticamente tudo, finalizo a faxina. Estou pronto para a próxima...

Luiz Cláudio dos Reis Campos-presidente do PSDB Uberaba- lucrc@terra.com.br

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