ARTICULISTAS

Adágio da dor nas telas de Fantato

Vi, por várias vezes, o vídeo que André Laterza fez, a distância – ele reside em Brasília –, sobre a obra de Hélvio Fantato

Jorge Nabut
Publicado em 16/01/2011 às 14:40Atualizado em 20/12/2022 às 02:07
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Vi, por várias vezes, o vídeo que André Laterza fez, a distância – ele reside em Brasília –, sobre a obra de Hélvio Fantato (Uberaba, 1920 – idem, 1997). Revi as telas que vira nascer em casa do artista ou na chacrinha chamada Girassol, no Alto Boa Vista. Por muitas vezes, toquei naquelas telas para admirá-las, escrever sobre elas e também levá-las ao Jockey Club, onde, duas vezes, sempre com Demilton Dib, organizei e ajudei a montar exposições delas; uma, por sinal inesquecível, ocupando todo o salão de festas, sobre imensa estrutura quadrangular de ferro.

No vídeo, as imagens passam como um filme, ou se fundem umas às outras, como em nossa memória, guiadas pelo Adágio Para Cordas, de Samuel Barber, querendo ser, ele próprio, também um adágio. Relutei em aceitar a música de Barber para uma obra “tão moderna”, pois era assim a pintura de Fantato, para os níveis artísticos de Uberaba. A música pareceu-me tão contraditória quanto anacrônica, mas logo entendi que o interesse do documentarista é a dor dos personagens (“Na sua arte ficam registrados os desamparados e os humilhados, com uma sensível exposição de suas feições sofridas, marcadas por tanta opressão”, diz o letreiro no final da exibição, ou ainda “Boa parte de sua obra mostra, de forma bem clara, toda a indignação que tinha com a desigualdade social”). Então, Laterza fala da dor, revelada por Fantato, e a dor é tema “tão clássico” como a música que serve de guia e de grife (no verdadeiro sentido da palavra) para ressaltar a profunda melancolia dos personagens que ocupam as telas.

Algumas imagens em movimento restauram e registram a ambiência da vida familiar e artística de Fantato, com imagens da esposa Natalícia (Pequetita) e dos filhos Helcio, Helenice, Heloísa e Helenilda (Uda). Um filme de poucas palavras – ou quase mudo – como o próprio artista, que trocou o discurso por pincéis e cinzéis (pois há várias esculturas em foco, que mereciam uma música mais contemporânea), mas um registro sensível de um artista que merece sempre voltar à tona, pois que foi um divisor de águas nas artes plásticas uberabenses e também um revelador do período de profícuas atividades culturais em todos os segmentos das artes.

Despretensioso, o documentário Hélvio Fantato – Talento Mineiro, traz de volta um artista querido de todos nós, deixando um gosto de “quero mais” – principalmente da pintura abstrata – nos seus 15 restritos minutos.

Diz Moacir Laterza que “Fantato nunca mentiu à vida, porque nunca mentiu a si mesmo” e nem à arte, acrescentamos nós.

O que se vê na arte de Fantato é a interpretação de suas preocupações sociais e estéticas, o rosto dos ??? sociais e dos familiares, pincelados com cores fortes  e às vezes puras – e gestos sempre vigorosos (ao contrário de sua maneira de ser, sempre dócil) e rápidos como, para nós, foi sua vida.

P.S. – André Laterza é filho de Mozart Laterza, sócio de pintor na loja de material elétrico que tinham na Rua do Comércio e que se chamava Laterza & Fantato. Reside em Brasília e utilizou, em grande parte, material enviado por Heloísa Fantato.

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