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A Vida Feliz

Estimado leitor, um dos mais instigantes filósofos de todos os tempos foi, sem dúvida, Aureliano Agostinho, que viveu entre 356 e 430, na Idade Média...

Mozart Lacerda Filho
Publicado em 03/08/2018 às 10:18Atualizado em 20/12/2022 às 13:25
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Estimado leitor, um dos mais instigantes filósofos de todos os tempos foi, sem dúvida, Aureliano Agostinho, que viveu entre 356 e 430, na Idade Média, portanto. Nascido em Tagaste, uma cidade africana, Agostinho nem sempre foi cristão e, durante um longo tempo, levou uma vida bastante desregrada.

Em 386, ele próprio nos narra, nas suas Confissões, que, após uma espécie de visão, converte-se ao cristianismo, para tranquilidade de sua mãe, Mônica, que teria orado por vinte anos ininterruptos para que o filho aceitasse a palavra de Deus.

Na Páscoa de 387, recém-converso, Agostinho, juntamente com o filho Adeodato, a mãe, um irmão e alguns discípulos, isola-se em um sítio e, depois de constantes discussões, escreve A Vida Feliz, uma das suas obras mais importantes.

Os grandes filósofos da Antiguidade já haviam se dedicado a encontrar aquilo que torna os homens felizes, uma vez que a felicidade era um tema bastante recorrente em seus trabalhos. Filósofos como Sócrates, Platão e Aristóteles já haviam combatido as concepções materialistas de felicidade. Para eles, a felicidade consiste em se aperfeiçoar como homem, ou seja, em desenvolver atividades que diferenciam o homem de todas as outras coisas.

Na sua obra, Agostinho abre mais o leque e, de certa forma, rompe com os gregos ao afirmar que a felicidade consiste na posse daquilo que jamais podemos perder. A felicidade é um bem incorruptível e imperecível e, por isso, não pode ser depositada em coisas que, a qualquer momento, podem ter fim. A felicidade, para o filósofo, está no desfrutar de uma consciência tranquila.

Numa das mais importantes passagens do livro, Agostinho ouve de Triségio, seu discípulo, que aquele homem rico, que pode possuir em abundância tudo o que deseja, é feliz, pois, mesmo perdendo tudo, ele pode adquirir novamente o que perdeu.

Agostinho contra-argumenta, afirmando que essa não é a verdadeira felicidade, uma vez que quem tem tudo do ponto de vista material tem, em igual proporção, medo de tudo perder, e a vida feliz consiste na posse de um bem permanente, e não passageiro. Por isso, a felicidade está na vida reta e justa, o que nos garante tranquilidade com a nossa própria consciência.

Essas reflexões me vieram à mente depois de assistir a uma série de documentários e palestras sobre os efeitos perniciosos do consumismo desenfreado. Ambientalistas, sociólogos, educadores, médicos entre outros estão preocupados com os péssimos hábitos de consumo da atual sociedade.

O que precisamos compreender é que, nas sociedades modernas (ou pós-modernas como querem alguns), a expectativa de uma vida feliz está depositada única e exclusivamente na posse de produtos e bens materiais. Quem não consegue possuir o que deseja é um eterno infeliz.

Como bilhões são gastos para nos fazer desejar sempre mais, temos um sentimento de infelicidade constante, pois logo após comprarmos algo, um vazio imenso nos invade e nos faz comprar novamente.

Partindo dessa lógica, pode-se facilmente deduzir que, quanto mais possuímos o que queremos, mais vazios e infelizes nos sentimos. Moral da história: quanto mais, menos. Quanto mais temos, menos felizes somos.

Alguém já entendeu que a infelicidade pode ser muito lucrativa.

(*) Doutorando em História e professor do Colégio Cenecista Dr. José Ferreira e da Facthus

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